domingo, 24 de novembro de 2013

Contraditório

Ele é filho de um escocês ruivo, alto e forte com uma negra mignon de pequenas proporções olhos grandes, refugiada da guerra na Angola. John McCoy dos Santos nasceu no Brasil, fruto genuíno de uma boa noitada, composta por um grande show de rock e um passeio na praia de Copacabana, mas não gosta mais de rock. Nem de praia. Formou-se em Direito pela USP, mas não advogou por muito tempo, porque não podia entrar no fórum de saiote. Ele alegava ser metade escocês, mas os juízes e serventuários sempre lembravam-no que o judiciário é cem por cento brasileiro. Não adiantava insistir, e ele só queria mesmo um motivo para largar o Direito. Em seguida, largou o saiote.
Ele é o retrato da contradição. Nos ombros, tatuagens de caveiras pegando fogo contam sobre uma juventude sobre duas rodas, nas estradas do país; no pescoço um coração  circunscrito com as iniciais "L&M" fala daquela por quem subiu sobre as duas rodas, e por conta da qual posteriormente abandonou a estrada, correndo risco de vida. A cara mais escura do que o corpo, manchada de ter sido repetidas vezes queimada pelo sol, a cabeça calva de poucos cabelos, cortados muito pequenos, e um rabo de cavalo (ou seria de porco?) enrolando-se por detrás da cabeça.
Braceletes em cada punho, tentam esconder muito mal símbolos como a caveira pirata e uma suástica. Ele, claro, nada ariano (se é que tal coisa realmente existe), se enchera de símbolos cujo significado desconhecia, em sua juventude rebelde, somente com a intenção de chocar. Mas, a despeito de sua louca aparência, ele se tornou um homem de bem, quando decidiu se tornar um homem.
Verdade, quando jovem, ele gostava muito de chocar, de sacudir as regras e subvertê-las. Isso é passado. Hoje, ele mudou bastante. Mas, continua diferentão. Está muito zen, e não quer mais chocar. Regularmente, cobre-se de humildes vestes orientais, e se entrega à meditação e aos mantras. Chocante, do mesmo jeito, pois saltam por debaixo de sua indumentária todo o mosaico de marcas permanentes produzidas durante sua adolescência.
Ele vinha exatamente assim, vestido semelhantemente a um monge, e entrou em seu escritório. Ah! Quase esquecera de dizer que ele é alto executivo de uma grande multinacional.