tag:blogger.com,1999:blog-76171390088380837982024-02-20T01:50:23.055-08:00Prosa ErrantePara que o acontecimento mais banal se torne uma aventura, é necessário e suficiente que o narremos.
(Jean-Paul Sartre)Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.comBlogger44125tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-61239155090516679722018-08-24T08:20:00.006-07:002021-10-01T10:58:26.645-07:00Despedida Ele desligou o carro, retirou a chave da ignição e a devolveu à ignição. Saiu. Não precisava mais se preocupar que alguém levasse o carro. Quem o faria? Olhou em volta e apreciou a beleza da desolada paisagem. A escuridão da noite se aproximava aos poucos, entre os prédios no horizonte oriental, mas, diferente de todos os dias, as luzes das janelas não acendiam.<br />
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Nas ruas, nenhuma viv'alma. Nos estacionamentos um carro ou outro sobrava perdido. Os demais seguiram com seus respectivos donos.<br />
<br />
Era difícil de entender como se chegou àquele ponto. O que houve? O que poderia ter sido feito para evitar. Não sabia.<br />
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Fez a volta no carro e abriu o compartimento traseiro. Já estava cheio, mas, era preciso achar mais espaço. Lembrou-se da esposa, mais cedo, lamentando ter um carro popular, pequeno. E da sua resposta, lembrando que pelo menos possuíam um carro. Muitos tiveram que partir com o que conseguissem carregar em mochilas e nas mãos.<br />
<br />
Mas, a quem queria enganar? Aonde iriam? Ninguém sabia! Logo, o tanque cheio de combustível estaria vazio, e não havia mais onde abastecer. O que fariam? Naturalmente, pegariam o que coubesse nas mochilas e nas mãos, como todo mundo.<br />
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Entrou em casa.<br /><br /> Tantas memórias, tantos objetos a muito custo comprados... tudo ficaria para trás. Não caberiam no carro, nem nas mochilas, nem nas mãos. Ficaria tudo para trás. Suas medalhas, conquistadas na juventude, as lembrancinhas feitas por seus filhos na escola, no dia dos pais... permaneceria tudo exposto em sua casa, como num museu sem visitantes.<br />
<br />
Era preciso pegar alimentos. Foi para a cozinha. A dispensa não tinha muitas alternativas, então pegou o que lá havia. Não havia mais mercado para abastecer.<br />
<br />
Tentava recapitular o que acontecera. Foi tudo muito rápido. Não teve aquele desespero de fim de mundo. Não houve aquele atropelar de acontecimentos, aquela difusão de pessoas partindo em desordem e caos. Havia sido como um melancólico fim de festa, quando ninguém mais vê sentido em ficar. Todos sabiam que era insustentável. Inclusive ele! Por que ele resistira tanto a partir?<br />
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Matutava essas e outras questões, incapaz de encontrar respostas. Parecia agora óbvio que o desfecho seria aquele. Tudo parecia muito natural, naquele momento. Mas, não antes. Um dia antes, ele parecia encontrar esperanças de que tudo se resolveria. Três dias antes, ele não apostaria que as pessoas deixariam tudo para trás. Uma semana antes, ele jamais acreditaria se dissessem que algo assim um dia aconteceria.<br />
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Olhou para o violão, e largou todos os alimentos de lado. Tinha que levar o violão. Talvez, aquele objeto fosse aquela coisinha que livraria ele da loucura. Mas, por quanto tempo? As cordas velhas, que ele tanto postergara trocar, não durariam muito. E não. Ele não conseguia encaixar o violão e o alimento no carro. Que sandice! Largou o violão.<br />
<br />
O que justificaria as grandes metrópoles virarem verdadeiras cidades fantasma?<br />
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Recolheu os alimentos, novamente. Levou para o carro, e reorganizou tudo o que estava lá dentro. Não caberia mais uma lâmina de barbear dentro do veículo, sem provocar um transbordamento. E ainda tinha de caber sua esposa e os dois filhos, de algum modo espremidos lá dentro. Será que os encontraria?<br />
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O céu estava escuro, agora. Nada fora do normal com a iluminação pública. Um poste com problemas, piscando; outro ali e mais um acolá com a lâmpada queimada. Mas, nenhuma casa ostentava lâmpadas acesas. Só a sua.<br />
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Ninguém nas ruas outrora tão movimentadas.<br />
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Desolador.<br />
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Solitário.<br />
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Tomado de uma angústia profunda, entrou no carro, girou a chave, acendeu os faróis e deu partida. É agora ou nunca!<br />
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Como a todos ocorrera, também seu tempo ali já era. Partiu.Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-27477351722650282402015-08-01T09:42:00.004-07:002021-10-01T10:58:40.317-07:00DireitosAquele jovem simpático ali do lado tem síndrome de Down. Aquela senhora, não. Ela é deficiente auditiva, diferentemente daquele outro rapaz, que ouve muito bem. Ele é daltônico, mas o senhor do lado não o é. Não é, mas, tem miopia avançada, e aquela moça bonita não tem. Ela é negra, que não é deficiência auditiva, não é limitação, não faz dela pior nem melhor, mas deixou de conquistar um emprego por isso. E é mulher, o que o rapaz daltônico não é. O rapaz daltônico é homem, assim como o senhor míope e o jovem com Down. Um deles é rico, e os outros não são.<br />
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Tem um homossexual nesse grupo. E alguém é soropositivo (tem o vírus HIV, mas, ainda não desenvolveu AIDS). Não são a mesma pessoa, mas poderiam. Nesse grupo, alguém é virgem, e alguém é do interior. Pode ser a mesma pessoa, mas, podem não ser. Alguém é da capital e alguém que não está no grupo é avô.<br />
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Alguém que não está no grupo quer entrar, mas, o grupo não deixa, porque esse alguém é oriental. Oriental. Pode ser japonês, coreano, chinês, tailandês... pode ser mongol, e não tem, definitivamente, síndrome de down.<br />
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O grupo aceitou um turco, após constatar que ele não é sovina. Não perceberam, ainda, que essa fama dos turco é preconceito. O turco vai entrar no grupo, mas, anda reticente porque soube que alguém no grupo é judeu. Um índio pediu para entrar.<br />
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Um outro índio disse que esse grupo não o representa, porque tem um evangélico no grupo achando que os índios que não aceitarem Jesus irão para o inferno. Ele não acredita no inferno, nem em Jesus. Chegou de fora do grupo um crente de mórmon defendendo que Jesus também contempla os ameríndios.<br />
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Alguém acha que a atitude do crente mais radical é errada, porque ele afasta as pessoas, em vez de as atrair. Outro concorda, mas, acha que é preciso conquistar fiéis. Um evangélico crente de fora do grupo acha que Jesus chamou, mas, não incomodou ou obrigou ninguém.<br />
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Alguém de fora se juntou ao índio anti-grupo, e separou "eles" (o grupo) de "nós" (os que não são do grupo), e achou que o grupo merecia rechaço público e social. O pessoal do grupo se divide entre os que acham legítimo manter a distinção para defender o grupo, e os que acreditam que é preciso se misturar com o mundo lá fora, para não aumentar o preconceito contra o grupo. Ambas opiniões têm eco fora do grupo, mas, a maioria dos membros do grupo acha que quem é de fora não tem legitimidade para pensar por eles.<br />
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O oriental era japonês e está fazendo confusão, porque não quer um coreano no grupo. Alguém corre com medo de um golpe de karatê, como se todo japonês lutasse. O coreano se ofendeu com a comparação. Parece que suas nações não se dão muito bem. "Mas, não são todos iguais? Não têm olho puxado?", alguém pergunta. Um chinês de fora do grupo também se ofendeu com o comentário.<br />
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Um branco ocidental de dentro do grupo faz piada sobre o pênis pequeno do japonês, e um negro de fora do grupo riu. Um negro de dentro do grupo reclamou da hipersexualização do negro, apesar de seu pênis ser, mesmo, estatisticamente maior que a média. Mas, só o japonês havia sido mencionado, até então. Alguém que é virgem se escandalizou com o debate tão indecente, e alguém fez chacota por ele se escandalizar tão fácil: "na sua terra tem semáforo? A coca-cola já chegou lá?"<br />
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O daltônico escutou a discussão pela metade e reclamou que tantos façam questão do semáforo, cujas cores não contemplam toda a população. Não é justo que ele seja excluído. A senhora com deficiência auditiva lembrou de ajustar o aparelho auditivo, e também acha que o mundo deve se adaptar a sua deficiência. Todos acham boa ideia usar sinais visuais par a sua deficiência e elogiam a eficiência do semáforo, para escândalo do daltônico.<br />
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Num canto, discute-se Jesus ou não Jesus, ou se Jesus veio ou não à América; n'outro, judeu briga com turco; homossexual discreto ofende homossexual que dá pinta; alguém que está brigando por causa de tamanho de pênis ofende o soropositivo que não é homossexual, e sua reação ofende o homossexual que não é soropisitivo; homossexual soropositivo de fora do grupo culpa a todos pelo preconceito; enquanto as vozes se elevam, uma flecha atravessa o grupo, e todos culpam o índio, que nada teve a ver com isso; no meio do tumulto, uma mão masculina acerta acidentalmente uma mulher, que corre para denunciar a violência de gênero (mas, não admite que o filho brinque de boneca); outro sai de perto da bagunça, e culpa o governo dos EUA pela confusão instalada: "qualquer um pode ver isso", diz, e arranja briga com o míope, que chegou no fim da conversa e não acha que qualquer um possa ver o que quer que seja; alguém de fora do grupo descobre nordestinos no grupo, e parte para agredir o grupo; o homossexual acha que foi homofobia, a negra pensa que foi racismo, e o nordestino... o nordestino não pensa nada a respeito, pois ninguém chegou a ele, enquanto ele começa a espancar o índio pela flecha; alguém de torcida organizada dentro do grupo descobre torcedor de time adversário fora do grupo, e ataca; fora do grupo, acusam todo o grupo pela violência; a polícia reage e manda o choque cercar o grupo; black blocks aparecem, para proteger o grupo, e tocam fogo em agências bancárias; alguém acha que o "black", de black blocks, é um termo inapropriado, porque são brancos, e entram na briga; outros acham que é inapropriado porque black blocks são vândalos, e, por meio da programação neurolinguística, as pessoas serão mais preconceituosas contra negros por causa do uso da palavra "black"; os dois grupos brigam entre si e contra os black blocks; a polícia abusa das balas de borracha e spray de pimenta, e acerta um black block que é negro, e que é anarquista proveniente da classe A; um negro que é contra os black blocks critica a polícia, e a acusa de fazer dele um alvo porque ele é negro; a briga se espalha pelo país, e o clima de ódio ganha as manchetes no mundo todo. Alguém culpa um determinado partido, e pede a ditadura; a confusão política esquenta, e partidos oportunistas se aproveitam do clima para se promover, e para isso alimentam o ódio; linchamentos, ataques e brigas se multiplicam pelas ruas; quando os protestos violentos são realizados por ricos, a polícia os protege, claro; protestos contra a violência terminam em brigas e depredação; alguns culpam aquele grupo por isso, e o grupo culpa pela confusão o preconceito contra o grupo; enquanto isso, alguns dos que vêem tudo pela televisão acham que só brigando assim, para se conquistar alguma coisa; outros defendem a luta pacífica, sem toda essa confusão; outros, por sua vez, acham que todos são baderneiros e pronto; e tem sempre os que acham que tanta confusão é falta de roupa pra lavar e alguns outros que dizem que isso tudo não vai dar em nada.<br />
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Sou um privilegiado: homem, branco, classe média, instruído, heterossexual, nacional no país em que vivo, não sou soropositivo, nem porto deficiência física ou mental, temporária ou definitiva. Olho a briga penalizado com o rumo que tudo toma. Muita confusão, mais segregação, nenhuma solução. Mas, olho de longe, porque assim me é imposto. Não sou legitimado por nenhum deles para falar por qualquer que seja.<br />
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Pena! Pessoalmente, preferiria me juntar a todos, para defendermos juntos nosso direito de ser gente.Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-91434857278829734862015-07-20T18:12:00.000-07:002021-10-01T10:58:46.950-07:00Homens casados - microcontoEla se casou, porque sempre gostou de homens casados. Nunca mais fez sexo: era fiel demais.Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-56912603347508949232015-07-07T07:04:00.001-07:002021-10-01T10:58:51.080-07:00Dentro do armário (nunca saberá)Diante da notícia de que eu terei mais um filho, muita gente tem perguntado se será menino ou menina. Bem, está cedo para sabermos, e tenho respondido com uma brincadeira com fundo de verdade: deixa ele crescer, que ele decide.<br />
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Algumas pessoas gostam da respostas, outras aplaudem, outras somente riem. Mas, o que me chamou a atenção é que houve quem questionasse: "quero saber se você vai dar essa abertura toda, mesmo, se ele chegar dizendo que é gay ou ela dizendo que é lésbica". E não foi só uma pessoa. Preciso dizer que é uma proposição besta? Talvez, por ignorância, talvez, por preconceito, mesmo, mas, é, no mínimo, besta.<br />
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Pois, aí vai. Fui criado num ambiente em que preconceitos com relação a orientação sexual não tem vez. Sério, mesmo. De tal modo que sempre tive toda liberdade do mundo para assumir para mim e para o mundo a minha orientação sexual. E isso nunca me fez homossexual, bissexual, transgênero, nem nada diferente do que eu sou. Pelo contrário. Sou um heterossexual desencanado, seguro de mim e de minha orientação sexual. Mas, sei que posso ser quem eu sou, independente de qualquer coisa, e isso me faz muito feliz!<br />
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Isso me fez pensar em outra coisa: se eu tenho e sempre tive a liberdade de ser quem sou, e poder assumir publicamente, com o apoio de minha família, e se isso me faz feliz, mesmo que não me mude em nada... bem, seguramente, uma família que tem a postura contrária tampouco muda a orientação sexual de seus filhos. Não evitam que eles se interessem por pessoas do mesmo gênero, por exemplo. Nem afetiva nem sexualmente! Mas, rouba-lhes a alegria de serem quem são. Rouba-lhes o orgulho de ter uma família que lhes ama e apoia independentemente do rumo que tomarem quanto à questão de gênero. Pior: rouba-lhes a coragem de viverem como lhes manda a sua natureza. É uma vida muito infeliz, disso não tenho dúvida.<br />
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Todo esse pensamento ainda me levou a uma outra conclusão: Famílias que não se importam com a orientação sexual sabem da orientação dos seus filhos. Famílias que adotam qualquer comportamento homofóbico, qualquer atitude preconceituosa tendem a nunca saberem (e, por mais que seus filhos pareçam "Machos" e suas fílhas "Mulheres femininas", jamais poderão ter certeza, em seus íntimos). Quando os filhos de famílias homofóbicas, por estímulos externos, resolvem ser quem são, encaram resistência e decepção em suas famílias, que, muitas vezes, terminam privando os filhos (e a si) até mesmo do convívio. Aí, o segredo fica super guardado. Temos visto bastante gente assumindo sua orientação sexual e de identidade de gênero. Mas, devido à intensa onda de agressividade anti-LGBT, não me espanta que o armário ainda esteja muito apertado.<br />
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Você, que bateria no filho ou expulsaria ele de casa, se ele fosse gay, sabe lá se ele já não é?<br />
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Nunca saberá!Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-68950575359280411032015-06-09T08:05:00.003-07:002021-10-01T10:58:56.108-07:00Com meus botões... - 1Pensando cá com meus botões...<br />
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Não sou, nem de longe a pessoa mais culta que eu conheço. Até onde vai minha percepção, sequer estou entre os mais cultos.<br />
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Mas, se tem uma coisa que eu sou é curioso.<br />
Todo dia, quero aprender mais e mais. Tantas coisas, que o tempo não permite. Tantas coisas, que a rotina não deixa.<br />
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Aprender a história disso, como fazer aquilo, e para que serve aquilo outro... aprender o que, por que, o onde e o quando... todos os dias, quase toda hora... aprender por leitura, aprender por experimentação, aprender com documentários... aprender culturas, artes, modalidades, escolas... conhecer ofícios, estudar ciências...<br />
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Sim. Definitivamente, curioso. É uma excelente definição de mim mesmo!<br />
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E não estou nem aí se foi a curiosidade que matou o gato...Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-5921569925752762082015-02-22T08:59:00.000-08:002021-10-01T10:59:11.158-07:00O EscritorEra rapaz, ainda, e já tinha reconhecido seu talento. Das entusiasmadas professoras de redação e literatura aos colegas escritores, todos nele identificavam uma capacidade extraordinária no manejo das palavras. Ora, o reconhecimento era merecido! Pelo menos, em grande parte, já que seu talento era fato.<br />
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Mas, fã de frases de efeito, e dotado de um vocabulário vastíssimo, obtido em suas intermináveis leituras de tantos livros de tantos autores de tantos estilos de tantas origens, mundo afora, tinha o defeito de enfeitar demais.<br />
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"E seguia o incauto beócio, ignorando que o opúsculo que, obstinado, perseverava espargir, aquinhoava aos borbotões os valores que lhe assolapavam prematuramente seu próprio sepulcro."<br />
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Aqueles que liam, dificilmente, passavam sem consultar dicionários, buscar significados na internet, ou de qualquer forma consultar o verdadeiro significado de tais palavras.<br />
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Os que, de imediato ou após pesquisa, compreendiam o sentido de suas palavras, frequentemente se impressionavam com tão culto escritor. Os que não compreendiam, com ou sem pesquisa, tanto admiravam quanto desenvolviam estranha adoração pela sua prolixa maneira de expressão.<br />
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E seguia escrevendo o jovem escritor.<br />
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"Era um belo espécime de varoa, aquela impúbere petiz. Dissemelhantemente, contudo, parecia aquilatar-se. Malsinava-lhe sua própria conduta, aluída e oscilante, ao passo que, bem apregoada por qualquer tratante mercador, de tal anúncio dimanaria demanda capaz de se lhe atestar veramente valiosa..."<br />
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É notório, no entanto, que seus textos eram cansativos. Tal como recebia os elogios com excessiva e falsa modéstia, fingia se aprazer das críticas negativas que poucos ousavam lhe oferecer, como que a demonstrar desapego e uma boa receptividade que jamais tivera. Mandava às favas as críticas, internamente, e ao diabo que os carregassem os críticos. Essa era a verdade que jamais ousava admitir, nem mesmo para si.<br />
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"Ufano se afigurava, explícito, notório. Cediço era, no entanto, que, por dentro, em nada passava de um verme liliputiano."<br />
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E foi premiado, o escritor. Publicou em toda parte sua obra. Os amigos que lhe estimavam perderam espaço em sua rotina. Os companheiros de projetos comuns rapidamente se tornaram muito abaixo daqueles com que ele, na condição de escritor reconhecido, se dignaria a compartilhar realizações. Abandonou-os, também. Por mais que negasse gostar, tinha o mundo literário a lamber-lhe os pés, e salivar-lhe as gônadas.<br />
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Agora, fazia pouco dos autores renomados. Em vez de agregar, enriquecer, assomar, fazia valer sua superioridade, em desprezo flagrante pelo público leitor de autores que considerava inferiores, em nível e qualidade. Tanto superara a todos, que, agora, seu desafio era superar-se a si.<br />
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"No calor de tamanha altercação, aparte à parte, a parte a que a parte o coração é a parte a partir da qual ele parte para não mais voltar".<br />
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E os leitores se deliciavam com tamanha habilidade com as palavras, embora grande parcela tenha sido incapaz de compreender sem ajuda dos estudiosos que o escritor tanto desprezava.<br />
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Mas, o escritor não viveria para sempre em sua juventude. O tempo vem a galope, e é para todos! O escritor envelheceu. O escritor fez escola, e vendeu milhões. Defendeu que seu estilo é o único correto, o único bom, embora sempre por meio das palavras de outrem, para não evidenciar sua própria empáfia. É feio elogiar-se a si, mas, há sempre quem queira fazê-lo por si, quando o elogio já foi feito antes.<br />
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Sim, o escritor envelheceu. E sua saúde já não é mais a mesma. Sobre a cama, envelhecido, ensimesmado, chora o escritor, sem permitir que o percebam. Tem a mente ativa, mas, não tem mais saúde para dar vida a suas ideias. Romances já não saem de sua mente para o papel, e contos já não caem sobre as teclas de sua velha máquina de datilografar.<br />
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Suas últimas palavras, a custo pronunciadas, jamais serão decifradas. Os presentes ouvem "eu sou uma fraude, uma farsa!", mas, é claro que jamais ele o seria, jamais ele o diria. Insistem em crer que as palavras veramente pronunciadas eram daquelas que ele escrevia, que não foram reconhecidas porque não eram conhecidas. Ah, essa mente que nós temos! Mente-nos, para preencher os buracos. E era o que melhor sabia fazer o escritor. Ou não.<br />
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Pablo de Araújo Gomes, 22 de fevereiro de 2015</div>
Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-51650427640509416642015-02-21T05:35:00.000-08:002021-10-01T10:59:14.056-07:00Só para garantir (ou O Tarado do Riacho)Manhã de sol, bom dia para uma boa caminhada. Francisco pôs suas roupas leves, calçou o tênis, e saiu.<br />
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Chico morava num sítio modesto, e vivia do que produzia. Já havia ordenhado as cabras, e tomou seu leite no belo café da manhã que sua irmã pusera à mesa. Já coletara os ovos, que também estiveram em seu prato. Havia cumprido cada mínimo afazer de sua rotina, e não era época de roça.<br />
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Foi para o mato, como gostava de dizer. Na verdade, estava seguindo rumo a uma pequena mata, que a família preservara do desmatamento. Lá, ainda podia ver alguns animais silvestres, livres, belos, saudáveis. Poderia tomar um banho de riacho, como sempre tomava, desde menino.<br />
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Ia pensando na alegria que era poder se banhar num riacho ainda preservado, de água límpida. Sabia que, mais à frente, aquela água ficava tão suja, tão poluída. Era triste pensar nisso. Preferia pensar na delícia do banho! Sem falar em algumas memórias inesquecíveis.<br />
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Sim, fora ali naquele riacho, em um de seus banhos inesquecíveis, que conhecera Júlia. Ah! Julinha... Não podia imaginar sua vida sem aquele dia em que avistou Julinha, a se banhar completamente desprevenida. Sim, desprovida mesmo das roupas íntimas. Como era bela, sua Julinha!<br />
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Lembrava ver as peças de roupa de Julinha jogadas a esmo, nos últimos metros da mata, antes de se aproximar do leito. Lembrava de a ter avistado, e observado escondido, de longe. Fê-lo, e o fazia regularmente, desde então, até que notou que ela não estava incauta. Verdade, Julinha dissimulava sua ignorância para não ter que mandar Chico embora.<br />
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Em verdade, suspeitava, mesmo, que Julinha lhe fizera notar quando quisera que percebesse, e ele, no fundo, nada descobriu sem seu ardil. Como era danada a Julinha! Morena matreira, menina virada! Moleca toda! Seus banhos logo passaram a ser acompanhados, ambos despidos, Chico e Julinha.<br />
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Eram banhos cheios de brincadeiras que beiravam o ingênuo. Mas, é óbvio que havia toda sorte de intenções libidinosas, de ambos os infantes. Por anos a fio brincaram, a brincadeira de crianças e a brincadeira proibida dos adultos. Foi com ela que ele descobriu os prazeres da carne. Lembrava-se. Tinham apenas treze anos, ele, e catorze, ela.<br />
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Riu-se com algum desprazer, quando lembrou o escândalo que aconteceu quando foram descobertos. Eram primos, não podiam. Levaram Julinha para longe, para morar com uma tia comum, na cidade. Nunca mais a vira por ali, depois de tantos anos, e sua presença na cidade era motivo para toda cautela dos familiares, que não lhes deixavam se encontrar. "Não se acende fogueira em relva seca", dizia sua tia, para justificar a proibição, "termina em queimada, e se perde o controle", completava o tio.<br />
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Absorto em seus devaneios, Chico já ouvia o marulho contínuo da suave correnteza contra as pedras do riacho, quando quase deixou de perceber uma blusa feminina, caída no chão. Não podia ser. Ou seria? Era coincidência, ou era sua Julinha?<br />
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Sentiu seu coração palpitar quando, em seguida, encontrou um sutiã. Fazia tanto tempo, e ainda assim os calores lhe tomavam o corpo com uma intensidade assustadora. Antes que avistasse uma bermuda feminina, mais à frente, já estava armada a tenda, abaixo da sua cintura.<br />
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Não tinha como não ser ela. Ele sabia que não. Estava tudo jogado do jeito que ele sempre encontrara: displicentemente despejadas as peças, conforme a ordem com que delas ela se desfazia. Não pensou mais, tinha que fazer uma entrada triunfal. Seu trunfo já estava palpitante, só precisava descobri-lo. Arrancou de si a blusa, e, da calça, soltou o botão e abriu a braguilha, deixando-a cair.<br />
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Acelerou o passo, enquanto quase caía para remover a cueca e jogá-la ao lado da calcinha caída ao chão. Chegaria no ponto certo. Nem notou onde deixara as percatas. Estava pronto, sentia-se lindo e na melhor forma. Ela iria se impressionar. Não esperou mais nada, não procurou brechar por entre a mata. Apareceu, mesmo, e de supetão.<br />
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"Julinha, meu amor! Quanta saudade! Estou pronto para! Cadê você?"<br />
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Enquanto ele saía da mata, olhava em volta, procurando por ela nadando. Mas, quando ultrapassou a barreira de troncos e de arbustos que ladeavam o leito do riacho, deparou-se com um grupo de lavadeiras, separando as roupas que seriam lavadas. Liderando as lavadeiras, sua tia Nadinalva, a mãe de Julinha. Na comitiva, a sua própria mãe, duas primas menos formosas que sua Fernanda e três irmãs mais velhas.<br />
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"Ah! Desgraçaaado!!!" Foi só o que ouviu. Sua mãe, irmã e primas atiraram-lhe roupas, e a tia Nadinalva, cutucada na ferida que jamais sarava, seguiu-lhe catando seixos sob os pés e atirando-lhes com força. Um ainda acertou as costas de Chico, que já havia disparado como um calango dando bote em muriçoca, e lhe doeria por anos. "Volte aqui, seu tarado descarado!! Violador de moças de família! Volte aqui se é homem, e encare uma mulher de verdade, seu cabra safado!!", vociferava sua tia, a cada pedra que atirava.<br />
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De volta em casa, ainda como viera ao mundo, Francisco se deparou com seu pai, um senhor religioso e apegado às tradições, recebendo a visita do cônego e beatas da vila, que planejavam um evento em honra à Maria da Conceição, para o mês seguinte.<br />
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"O que é que está acontecendo aqui?!?!", enfureceu-se o Seu Geraldo. Mas, é claro que a pergunta era retórica. Ele não esperava que Chico parasse para responder. E Chico não ousava. Pensou em voltar e correr para se esconder no galinheiro ou no estábulo, mas, certamente, isso passaria a mensagem errada.<br />
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Atravessou pelo meio da comitiva religiosa, para entrar no seu quarto, mais à frente, e, quando se virou de lado para passar pelo clérigo, teve quase certeza que acertara algo indevido na mão do líder religioso. Não tinha tempo de se envergonhar mais, nem mesmo do olhar interessado da Irmã Dulce. Com o lenço encarnado, que devia lhe identificar como beata, a irmã atirou-lhe um olhar lascivo que foi mais constrangedor do que tudo, e Chico, chocado, fez que não viu.<br />
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A bem da verdade, boa parte das coisas se acertaram, depois. Seu Geraldo fez saber publicamente que punira severamente o filho, mas, na verdade, quando soube que ele fizera o que fizera porque era homem, o perdoou e riu com ele da situação. "Só nunca mais me faça uma cena daquelas com o cônego e as beatas! A velha Dulce nunca mais vai querer rezar um Pai Nosso, se o <i>"Pade Ciço"</i> não tiver o tamanho do seu!", riu do interesse da viúva no filho. E, no mais, era isso mesmo. Os outros que mantivessem amarradas suas cabritas, porque seu bode estava solto e na ativa!<br />
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A mãe, por sua vez, suspeitou da cumplicidade dos dois, porque homem que é homem nunca consegue esconder nada de mulher nenhuma. Obrigou o filho a se desculpar de todas as mulheres que o viram no riacho (não chegou a saber do incidente em casa, o que certamente lhe poupou de um enfarte).<br />
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As primas, por falar nisso, nunca mais o olharam com os mesmos olhos. Agora, era de soslaio que lhe viam, proibidas de interagir com ele, mas, sempre fantasiando encontrá-lo às escondidas, como Fernanda. Às vezes, ao lembrar de Chico, era um suspirar coletivo, e, sempre que podiam, arranjavam roupas para lavar no riacho. Inútil, pois o primo estava terminantemente proibido de sair de onde sua mãe o pudesse ver. Nada, sequer, de adentrar na mata! Recomendação especial às meninas: "Cuidado pr'as roupas não caírem mais do balaio! Amarra esse troço direito!".<br />
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Já a tia, coitada. Passada a raiva, teve um passamento, e caiu com todos os seus quase cem quilos, compactados num corpo que não denunciava tanto peso. Nunca mais perdoaria o sobrinho, nem a filha, coitada, que nada sabia, mas, enfrentou a ira de cada parente que apareceu para lhe dar um rela daqueles! E olhe que foram muitos, que apareceram somente para lhe arrancar o couro, e só aos poucos ela pôde juntar as peças do quebra-cabeças e entender um pouco do que se passava.<br />
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No fundo, a julgar pela declaração que ele fez, ao surgir da mata ("estou pronto pra você, Julinha", e coisa e tal), todas, eram capazes de jurar de pé junto que Chico e Julinha ainda andavam se encontrando às escondidas. Como ela faria para vir da cidade, não se sabia. Mandaram-na para a capital, por via das dúvidas, a quase um dia de viagem, só para garantir.<br />
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Pablo de Araújo Gomes, 20 de fevereiro de 2015</div>
Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-36630775146996603982013-11-24T17:54:00.001-08:002021-10-01T10:59:18.615-07:00ContraditórioEle é filho de um escocês ruivo, alto e forte com uma negra <i>mignon</i> de pequenas proporções olhos grandes, refugiada da guerra na Angola. John McCoy dos Santos nasceu no Brasil, fruto genuíno de uma boa noitada, composta por um grande show de rock e um passeio na praia de Copacabana, mas não gosta mais de rock. Nem de praia. Formou-se em Direito pela USP, mas não advogou por muito tempo, porque não podia entrar no fórum de saiote. Ele alegava ser metade escocês, mas os juízes e serventuários sempre lembravam-no que o judiciário é cem por cento brasileiro. Não adiantava insistir, e ele só queria mesmo um motivo para largar o Direito. Em seguida, largou o saiote.<br />
Ele é o retrato da contradição. Nos ombros, tatuagens de caveiras pegando fogo contam sobre uma juventude sobre duas rodas, nas estradas do país; no pescoço um coração circunscrito com as iniciais "L&M" fala daquela por quem subiu sobre as duas rodas, e por conta da qual posteriormente abandonou a estrada, correndo risco de vida. A cara mais escura do que o corpo, manchada de ter sido repetidas vezes queimada pelo sol, a cabeça calva de poucos cabelos, cortados muito pequenos, e um rabo de cavalo (ou seria de porco?) enrolando-se por detrás da cabeça.<br />
Braceletes em cada punho, tentam esconder muito mal símbolos como a caveira pirata e uma suástica. Ele, claro, nada ariano (se é que tal coisa realmente existe), se enchera de símbolos cujo significado desconhecia, em sua juventude rebelde, somente com a intenção de chocar. Mas, a despeito de sua louca aparência, ele se tornou um homem de bem, quando decidiu se tornar um homem.<br />
Verdade, quando jovem, ele gostava muito de chocar, de sacudir as regras e subvertê-las. Isso é passado. Hoje, ele mudou bastante. Mas, continua diferentão. Está muito zen, e não quer mais chocar. Regularmente, cobre-se de humildes vestes orientais, e se entrega à meditação e aos mantras. Chocante, do mesmo jeito, pois saltam por debaixo de sua indumentária todo o mosaico de marcas permanentes produzidas durante sua adolescência.<br />
Ele vinha exatamente assim, vestido semelhantemente a um monge, e entrou em seu escritório. Ah! Quase esquecera de dizer que ele é alto executivo de uma grande multinacional. Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-83348461349339705492013-10-01T11:05:00.000-07:002021-10-01T11:08:23.126-07:00DesabafoComeça no domingo.<br />
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Quando o crepúsculo ameaça o dia, o primeiro arranhão fere o coração como uma garra cravada no peito. O pôr-do-sol termina de rasgar, o corpo curva, o humor recrudesce uma miríade de pequenos desconfortos e inconformações. Tudo parece ruim. A voz do apresentador dominical na televisão, seguida do jornal de domingo à noite são duros golpes, e extraem algumas lágrimas. Desliga-se a televisão. Mas, o relógio é cruel. As horas insistem em passar rapidamente, e não há distração que me retire deste estado de ansiedade. Cada hora parece preceder a minha própria execução.<br />
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Mas, a hora de dormir é inevitável. Deitar e rolar nunca pareceu algo tão penoso. O sono não vem. As horas passam do galope ao trote, como se o tempo quisesse parar. Horas se passam após a meia-noite, até que o sono seja autorizado a pousar sobre um corpo cansado pela inquieta mente.<br />
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Amanhece. Segunda-feira, agora é oficial. O despertador toca dezenas de vezes, mas estou desperto desde a primeira ou a segunda. Recuso-me a acordar. Recuso-me a levantar. Não, eu, na verdade. Meu corpo não responde. Uma angústia pesada espreme meu estômago, e comer qualquer coisa é penoso. Terminar o café da manhã enjoado é uma certeza. Mas, é inevitável. O banho parece se recusar a começar, e não termina sem a água fria do chuveiro ter se misturado a gotas quentes e salgadas de um pranto travado e insuportavelmente doloroso. Recomposto, visto-me o mais rápido possível. De outra forma, desistiria de fazê-lo. Demoro mais do que o usual tentando lembrar de tudo o que preciso levar, apesar de tudo já estar previamente disposto em um só lugar, na tentativa de nada esquecer. Saio com a sensação de carregar uma geladeira nas costas. Assim começa o meu dia, de segunda a sexta-feira.<br />
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Se tenho comigo a minha filha, responsabilidade maior, e não há tempo de fazer pausas ou demoras, levanto cedo, preparo-a no ritmo dela (ritmo que precisa de bons empurrões, quase sempre), e a levo para a escola. Nesse momento, toda a ansiedade que já me vem acompanhando desde o despertar cai sobre mim como um piano atirado do alto de um edifício.<br />
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Chego ao ambiente de trabalho. A certeza de um dia desagradável me causa taquicardia e asia. Caminho rumo a minha sala como um boi que sabe que vai ao matadouro. No caminho, encontro pessoas, de quem não consigo esconder todo o meu desespero. Declaro que não quero esconder, como uma maneira de perdoar-me, eu mesmo, por minha indiscrição, mas oculto as maiores dores, e sigo para o meu local de trabalho, torcendo para não encontrar mais ninguém. Vez ou outra, meu trabalho começa nesse ínterim, abordado por colegas que dependem de uma carimbada minha ou de meu setor, e cujo caso não recordo o suficiente para explanar.<br />
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Gosto de chegar simpaticamente, sorrindo para todos, e fazer do meu início de dia uma promessa de bons tempos. Gosto de cumprimentar alegremente a todos os colegas, distribuindo cumprimentos, abraços ou beijinhos. Esqueça. Não, mais. Não consigo. Além do que, parte da equipe já é causadora de tanto desconforto, e falsidade jamais foi o meu forte.<br />
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Durante o dia, recebo inúmeras prioridades, nada é postergável por mais de um dia, quando o é por mais de um turno. Mas, mesmo quando algo é considerado prioritário pela chefia, tal prioridade é prejudicada pelas constantes interrupções, inclusive de quem a julgou tão importante. Tudo o mais, na medida em que chega, é mais importante, naquele momento. Tudo o mais, especialmente as dezenas de pequenas providências pontuais, precisa ser feito imediatamente. Mesmo aquelas que, se tratadas de maneira mais sistemática com um procedimento simples e mais efetivo, seriam dispensáveis, ou significativamente reduzidas. Não importa. O saldo é um sem-fim de ações pela metade, de difícil retomada, refletindo em uma desordem absoluta de papéis sobre a mesa. O telefone não para de tocar, e eventualmente eu recebo a ordem ou decido não atender telefonemas, para tentar concluir alguma atividade até o fim. Normalmente, não vinga. A esta altura, já tenho dor de cabeça. Uma dor de cabeça mágica, diária, que me deixa logo após o fim do expediente, e é substituída por um sono irresistível.<br />
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Ponho uma música no ouvido, para distrair. Por educação, em um dos ouvidos. Às vezes, em ambos, que é a única maneira de concentrar no trabalho. Talvez, às vezes, não seja questão de ouvir a música, mas de não ouvir o inferno de vozes e toques de telefones que me rodeia. Exceto pelos toques de telefone, normalmente todo o ruído não me incomodaria, em circunstâncias normais, mas a minha concentração está completamente minada. Não é possível manter a concentração em uma só atividade por mais de três, cinco minutos, e esse nível de dispersão muito me incomoda. De tempos em tempos, percebo-me alheio, a música tocando à toa nos fones depositados sobre a mesa, as mãos sobre o teclado e o olhar perdido em lugar algum.<br />
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De tempos em tempos, surge uma série de demandas para resposta imediata, que adiciona doses cavalares de adrenalina em minhas veias. Não raro, vou almoçar agitado, eventualmente recebendo algum e-mail cobrando "cadê você?", como se não tivesse direito às minhas horas de almoço.<br />
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Aliás, há uma preocupação obcecada de meus colegas (às vezes, da chefia, mas mais dos colegas) com o meu horárío. Não há muitos que se preocupavam quando eu almoçava meia-hora em vez de duas, ou que se importassem quando eu ficava até quase meia-noite, trabalhando. Não havia muitos que se preocupassem quando eu trabalhei, em média, duas a quatro horas a mais de que as que deveria. Mas, muito lhes incomodou (não a todos, mas à maioria) que eu tenha feito uso do direito que a lei confere ao servidor estudante, de ter o horário especial, compensando as horas posteriormente. As horas eram devidamente trabalhadas, mas muitos pegaram no meu pé por estar em horário diferenciado (apesar de ser direito, e não luxo). Alguns são obcecados, até hoje, com as minhas horas, parecendo esquecer da própria vida.<br />
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Por isso, decidi não mais fazer hora extra. Estou quase conseguindo. Ultimamente, tenho contado os minutos que faltam para o fim do expediente, e tentado sair exatamente na hora, sempre que possível. Sempre que possível, pelo menos. Saio fugido, porque, se não o fizer, haverá serviço a desempenhar.<br />
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Caminhava só, e completamente só seguia sua caminhada, sob um sol forte, alto, intensamente quente, que fazia questão de exibir o longo e deserto descampado que a cercava. Seu vestido inflava-se ao vento quente e seco, que insistia em invadir seus olhos, boca, narinas e orelhas com grãos de uma areia grossa. Silêncio.<br />
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Era quente, e no entanto ela sentia frio. Não pelo vento, que parecia torrar sua pele. Nada a confortava. O açoite do vento era sua menor preocupação ou o sol, ou mesmo o seu frio. Afligia-a aquele sangue que escorria por suas mãos, um sangue quente, fresco que não coagulava jamais.<br />
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Ela pensava no que poderia tê-la levado àquele lugar, o que a teria posto naquele estado. Ela sabia, mas não podia crer. Há quanto tempo caminhava a esmo? Quanto mais caminharia até encontrar uma viva alma. O sol não se punha nunca, sequer saía do lugar. Sim, ele queria mostrar que ela estava só, tudo a sua volta lhe dizia isso. Estava farta disso, não suportava estar só. Nunca suportara.<br />
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Olhou para trás. No chão batido, somente as suas pegadas, acompanhadas, vez ou outra, por um caminho sutil de sangue que não cessava de escorrer por suas mãos. Sentou-se. Não sentia suas mãos. O chão, rijo e seco não lhe dava conforto. Nada lhe dava conforto. Ela estava só.<br />
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Olhou seus pulsos, e quis chorar, mas não conseguiu. Feridos, abertos, irremediavelmente cortados. Ela conseguira. Mas, e daí?<br />
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Tentava justificar sua atitude: perdera a mãe no parto, mal conhecera o ocupado e ausente pai por toda vida. Foi uma criança só e difícil de lidar. Jovem e bela, casou-se sem amor com qualquer um, para aplacar a solidão, e ele não a suportou. Cedo, viu seus filhos morrerem, seu marido a abandonou sem prévio aviso ou posterior justificativa. Viveu só, desde então, naquela casa enorme, e jamais suportaria aquilo. Sem dinheiro, nem mais pôde manter as criadas. Era solidão além de suas forças. Era dor acima de sua tolerância. Suportara por anos, até não mais poder. Pais, parentes, a sociedade, todos pareciam tê-la condenado à solidão, e ela não nascera para viver sem mais ninguém. Mas não procurara sair da casca em que se enclausurara, antes optara por fechar-se ainda mais. Não poderia ter dado certo. No fundo, sabia que ela era quem afastava todos de si, mas mudar-se a si era mais do que estava disposta a fazer, devia haver algum caminho mais fácil.<br />
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Por isso, cortou os pulsos: para pôr fim ao seu sofrimento, para findar sua solidão. Assim, perdeu as forças, pouco a pouco, no meio da sala. Assim, começou a sentir aquele frio, a não sentir suas mãos. Assim, acordara confusa, perdida, sem nada mais ver, além de chão, sem nada mais ouvir além dos próprios passos, que não ousavam ecoar, para não lhe dar o prazer de sentir-se acompanhada. Em seu íntimo, sabia que só lhe restara a solidão. Nada mais.<br />
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Por ser só, condenara-se à solidão. Começava a entender que fugir somente a poderia ter afastado, jamais aproximado.<br />
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Pablo de Araújo Gomes, julho de 2012</div>
Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com1Recife - PE, Brasil-8.0542775 -34.8812561-8.180054 -35.0391846 -7.928501 -34.723327600000005tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-51498447868388022352011-06-26T20:41:00.000-07:002021-10-01T11:06:27.478-07:00Microconto: Uma microapresentação<br />Milehttp://www.blogger.com/profile/10531449184084848167noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-66307521613307958952011-06-19T21:05:00.000-07:002021-10-01T11:06:36.828-07:00Toda Aquela Carne - Ela sabe que é gostosa...<br />
Com essa frase completamente espontânea, e o olhar fixo no rebolado daquela loira, alta e belíssima mulher, ele introduziu a conversa com um desconhecido, tão estarrecido quanto ele com a majestade com que ela rebolava sobre aqueles altíssimos saltos. Ela fazia de uma simples caminhada um espetáculo.<br />
- Ela poderia ser modelo... - disse o estranho, ao que emendou - se modelo tivesse carne...<br />
Essa resposta, de algum modo, o surpreendeu, tirando-o do torpor. Mas é verdade, ela parecia desfilar. Não do modo afetado das passarelas, mas desfilava, em clara exibição de seus espetaculares atributos físicos. Sobre a questão da carne, alvo do seu susto, sua preocupação se diluiu. Aquele filósofo popular, seu interlocutor, notara a carne como um atributo, uma propriedade, não uma definição da mulher. Em outras palavras, ele não a tratou como um pedaço de carne, como muitas se queixariam, mas como uma mulher que anda belissimamente, e que é dotada de bastante carne. Talvez, seu pecado, mais do que o machismo de que seria acusado por muitas feministas, tenha sido, no velho dilema da forma e do conteúdo, ter se concentrado no conteúdo errado, induzido por daquelas formas perturbantes.<br />
<br />
O tempo correu, mas aquela cena hipnotizante não lhe saiu da cabeça. Aquela mulher desfilando diante de si lhe dera a dimensão de sua pequenez neste universo injusto em que essas mulheres só te pertencem se você está dormindo. E ainda assim, nem sempre. E assim, muitas belas mulheres passaram diante dele, naquele dia, mas nenhuma estivera à altura daquela que o surpreendera. Nenhuma à sua altura? Mais que isso, nenhuma que chegasse aos seus pés, calcados sobre aqueles saltos vermelhos, a modelar suas carnudas batatas das pernas.<br />
Ele se surpreendeu ao pensar na dimensão culinária de sua observação. Batatas, carne... carnudas! Lembrar do comentário que ouvira foi inevitável, obra formidável e terrível do acaso de as palavras se encaixarem tão bem. Sim, acima daqueles tornozelos muito bem torneados, havia batatas carnudas, havia coxas muito carnudas, havia... muita carne em partes de sua anatomia que despertam a adoração de muitos homens, sem dúvida. Muita carne, sempre bem distribuída, cada pedaço em seu devido lugar. Ele já suava frio só de pensar.<br />
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Mas não eram apenas as glândulas de sua pele que se puseram a trabalhar, pensar em tanta carne já lhe dava água na boca. Passou a observar nas mulheres que passavam, de início com o tom jocoso do descrédito, e depois até assustado com o rumo a que tudo isso lhe levava, quais carnes eram mais macias, ou mais firmes, consistentes... Mais parecia que queria separar o que iria para um churrasco ou para um cozido. E terminou por se imaginar em um ato pleno de antropofagia, comendo as mulheres, claro, no sentido literal, e começou a entrar em pânico, pois não queria pensar deste modo das mulheres que ele admirava tanto e nada mais parecia normal porque ele via as mulheres passarem e sentia uma fome horrenda que nada parecia capaz de saciar nem mesmo quando ele comia qualquer coisa como aquela maçã que ele robou da banca da feira para enganar a fome enquanto corria para longe das mulheres que via mas nada disso adiantava e parecia que ele não iria resistir e acabaria tirando um pedaço de alguma a qualquer momento e agora já nem fazia questão de assar ou cozir porque tudo parecia muito bom do jeito que estava e...<br />
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Oi? Ah, me desculpe. Sim, tá bom, vou falar devagar. Afinal, a nóia é dele, não minha, não é mesmo? <br />
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Mas o fato é que ele já mal se continha. Desejava as mulheres de modo que jamais antes desejara. Literalmente. E isso era algo difícil de lidar, o novo. Contra a sua vontade, planejava a caça, capturas diversas, imaginava momentos de deleite insuplantáveis pela razão. Vitimado inconteste de sua confusa condição, a um passo de dar o bote sobre uma belíssima adolescente, lançou-se de sobre a ponte, e jamais voltou a ser visto.<br />
Dentro de uma semana, no entanto, passou-se a registrar nos cadernos policiais daquela pacata região, quase que semanalmente, o desaparecimento de mulheres, entre dezesseis e vinte e oito anos, em geral. O filósofo popular que deu início às tais perigosas divagações jamais desconfiou de sua participação em tais crimes, e a loira charmosa, que sabia que é gostosa, justamente por isso, deu o fora dali. Era loira, mas não se limitava ao estereótipo, e sabia que era uma vítima potencial. Partiu dali para muito longe, aquela que era, talvez, o único antídoto: se ela não fosse tão gostosa quanto julgara, talvez ele perdesse o gosto pela coisa. Ou não?<br />
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Pablo de Araújo Gomes, junho de 2011</div>
Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-79371670698565486552010-12-01T04:41:00.000-08:002021-10-01T11:06:47.782-07:00Com uma banana Muitos há que se desesperam com o menor problema. E com o maior, também. Isso quase chega a ser engraçado, já que é fato notório e conhecido que assim não se chega a lugar algum, que assim não se resolve qualquer problema.<div> Bem, o fato é que nem sempre temos as ferramentas necessárias para resolver os nossos problemas. Ou parecemos não ter, pois não dispomos das ferramentas ideais. Mas, muitas vezes, se usarmos a cabeça, podemos notar que temos, sim, como resolver os problemas, mas não dando murros em ponta de faca. Deixe-me esclarecer melhor.</div><div> Usemos um exemplo bizarro, mas bem ilustrativo: um assassino quer esfaquear alguém. Nada fora do comum, certo? Mas eis que ele tão-somente dispõe de uma banana, de nada mais. Sou capaz de assegurar-lhes: não é possível esfaquear alguém com uma banana. Mas o objetivo do assassino, se você pensar bem, não é esfaquear, mas matar. Então, ele pode cumprir seu objetivo sem espatifar inutilmente a banana na barriga do indivíduo, se optar pelo sufocamento com a banana. Exige, claro, um pouco mais de habilidade. Certamente, não será tão fácil como se ele dispusesse de uma boa faca. Mas ele atingiria seu problema melhor do que se simplesmente "espetasse" a banana contra o peito de seu desafeto, o que, seguramente, não daria em nada além de uma sujeira danada e um bate-boca que poderia culminar numa briga. Gasto inútil de energia, eu diria.</div><div> Há muita gente tentando esfaquear seus problemas com bananas, todos os dias, em toda a parte. Este problema é decorrente de um velho vício: a preguiça que se tem de pensar. Muita gente se arvora a bandeira da racionalidade, e se utiliza dela para identificar uma distinção essencial entre si, como ser humano, e os demais animais, como uma espécie de <i>ralé</i> da natureza. Mas na hora de pensar, não se dão ao trabalho de pensar um pouco no que vão fazer. E fazem o maior <i>melelê</i>, claro.</div><div> Que tal se mudarmos de atitude? Não proponho que saiam por aí sufocando as pessoas com bananas, é óbvio! Mas a atitude de pensar na melhor maneira de resolver os problemas é uma boa alternativa, e é isso o que defendo. Seja radical: localize não só o problema, mas a sua raiz. Identifique a causa, pois é ela que você deve combater. Lembre-se: o objetivo do assassino não é esfaquear, mas matar. Theodore Roosvelt (não que eu seja fã dele, mas...), um ex-presidente dos EUA, eternizou uma frase bem interessante: "Faça o que puder, com o que tiver, onde estiver.". Nosso assassino fez isso, mas não tentou atirar no candidato a presunto, nem feri-lo. Com uma banana, não dava. Mas ele identificou o problema, o objetivo, e o meio de que dispunha. E os conjugou. <i>Fiat lux!</i></div><div> Eventualmente, você vai se deparar com problemas mais complexos, como combater a fome, por exemplo, numa região muito carente. Nem sempre é possível resolver o problema maior pela raiz e ignorar os sintomas deste problema. Neste novo exemplo, é importante lembrar que, enquanto você está ensinando alguém a pescar, ele pode não aprender simplesmente por estar com tanta fome que tem um déficit de aprendizado, ou mesmo porque até pegar o primeiro peixe por conta própria poderá ter morrido de fome. Nestes momentos, cabe conjugar os distintos problemas que constituem uma problemática maior, pesá-los, medi-los, analisá-los, e solucioná-los. É um pouco mais trabalhoso, e muito mais dinâmico do que o problema do assassino, já que as circunstâncias mudam conforme os problemas vão sendo resolvidos. Mas, pense pelo lado positivo: entre uma aula e outra, você pode alimentar o aluno com uma banana...</div><div><br />
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</div><div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 1 de dezembro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-36670919618373102072010-12-01T00:01:00.000-08:002021-10-01T11:06:51.336-07:00Arte Conceitual: Duendes, Papai Noel e Karl MarxOlá, pessoal,<br />
O Conceito que trago para ser desenvolvido tem a ver com o espírito natalino. É um tema que um amigo meu, <i>Rafael Barreiros</i>, me apresentou há muitos anos, ocasião em que afirmou que não faz questão de exclusividade sobre o tema, que ele mesmo pensava em desenvolver para Teatro.<br />
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Imagine que o Papai Noel foi raptado por seus duendes, às vésperas do período natalino. A razão: eles andaram lendo um complexo livro, intitulado "O Capital", de autoria de Karl Marxs e Friedrich Engels, e chegaram à conclusão de que eram explorados pelo Papai Noel que, ainda por cima, ficava com os louros e a glória de ser o bom velhinho, enquanto eles ficavam só com o trabalho.<br />
<br />
Bem, a idéia de meu amigo vai além disso, mas, acredito que isto por si só já é suficiente para provocar a imaginação de quem quiser escrever algo a respeito. Vocês já têm o tema, agora é hora de criar!<br />
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Obrigado, Rafael!<br />
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<div style="text-align: right;">Abraços a todos!</div><div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-30872631124546480072010-03-11T04:48:00.020-08:002021-10-01T11:07:09.423-07:00Desencontros Era um magnífico dia de sol. Antonio – Toni, como lhe chamavam os pais italianos – curtia, inocente e impunemente, uma praia, já que ninguém é de ferro. Foi quando entrou em cena, deslizando por sobre a areia da praia com uma beleza extraordinária, e uma canga que delineava suas qualidades, uma verdadeira deusa de Ébano.<br />
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Ela armou sobre a areia sua cadeira de praia, e, cuidadosamente, iluminou a praia com a sua beleza negra, ao remover a canga branca que ousava roubar do público aquela visão do paraíso. Sentou-se, saindo do campo de visão da maioria, e com isso privou Toni do prazer de desfrutar daquele colírio para seus olhos. Foi assim, pelo menos, que Toni – e, certamente, metade dos presentes – percebeu a chegada da moça.<br />
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Toni não podia apenas esperar. Tinha que agir. Levantou-se. Mas, fazer o quê? Sentou, novamente. Ele não sabia como agir, mas não tirava os olhos daquela mulher única. Precisava, decididamente, fazer algo. Observou que, ao seu lado, ela começava a escrever algo na areia. Ele parou. Esperou. Droga! O mar apagou. A maré estava enchendo, e ela, sem saber, pusera sua cadeira em rota de colisão com a subida da maré. Ela se levantou, para o deleite de toda a população masculina da praia (e desgosto das esposas e namoradas presentes), afastou a cadeira alguns metros do mar, e a colocou praticamente ao lado de Toni – o que quase o fez enfartar, e, certamente, matou os demais homens e uma ou outra mulher de inveja.<br />
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Ela se sentou, novamente. Agora, bem aos olhos de seu mais devotado observador. Começou, novamente, a escrever algo. Logo, se delineou um belo “E”. Suspense no ar. Um “l”, seguido em seguida de um outro “l”… opa! Um ambulante, distraído, desmanchou tudo. Pediu desculpas, e só então viu a moça. Babou, quando a viu, quase lhe dava suas mercadorias, em pedido de desculpas, mas ela recusou. “Tá tudo bem, moço. Pode seguir seu dia.”. Toni já tinha ímpetos de ir surrar o cara. Quem lhe dava o direito de atrapalhar e, pior, se enxerir para a sua garota?<br />
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Ela, enfim, recomeçou: “Ell”, parou. Olhou para ele, sutilmente. Ele, que observava de maneira nada sutil, tentando claramente xeretar o que ela escrevia, desviou o olhar, sem graça. Ela retomou. Escreveu um “y”. Escrevia com uma bela grafia, e cheia de floreios, como a declarar que sabia o quanto era bela; “d” e, para o arremate final, “a”. Ellyda. Seria este o seu nome, pensou Toni.<br />
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Já seria um bom começo, então, para uma abordagem. “Olá, Ellyda!”, “Como você sabe o meu nome? Andou me espionando?”, “Calma, eu só li o nome que você escreveu na areia!”. Não, talvez ela fosse menos paranóica, ou se sentisse um pouco invadida. “Oi, Ellyda!”, “O quê?”, “Oi, Ellyda!”, “Desculpa, mas, não me chamo Ellyda.”, “Não? Mas…”, “Esse é o nome da minha namorada.”. Cruel! Ou, talvez, em vez desta última declaração, “Não, não. É que acabo de saber que estou grávida, e estou tentando escolher o nome.”, “Ah, mas você já sabe qual o sexo?”, “Todos os possíveis! Ricardão é ótimo na cama!”, “Não, o sexo do bebê.”, “Seu tarado!”, “Não, dona, quero dizer que você estava escrevendo um nome de menina. E se nascer menino?”, “Ah, se for menino, o pai escolhe o nome. Olha ele chegando aí!”. Não! Esta última versão do diálogo ainda terminaria em confusão. Até porque, garotas bonitas têm o mau gosto de namorar caras marombados, ou lutadores de jiu-jitsu. “Tô fora!”, pensou Toni.<br />
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Toni estava tão distraído que não reparou quando sua amiga Flávia passava. Mas ela reparou que ele estava sentado, e se aproximou. “Oi, Toni!”, “Eh… Oi, Flávia!”, beijinhos, beijinhos, “Como você tá, menino?”, “Tô legal! Você também parece ótima!”, e por aí vai. Aqueles papos de “nunca mais mandou notícias”, “é, a vida anda uma loucura”, e outras banalidades completamente previsíveis. Flávia. Louríssima, gatíssima, linda, exuberante! Mas Toni mal conseguia tirar os olhos daquela outra moça, que brilhava à luz do sol. Aliás, ela parecia ainda estar escrevendo algo, mas Toni não conseguiu olhar, tentando não dar a perceber que já não escutava sua amiga. “Tchau, meu lindo! Vê se me liga, hein? A gente ainda tá se devendo conhecer aquela boate…”, “Ligo, sim!”, beijos à distância, um aceno. Toni, então, olha para o lado. Decepção.<br />
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“Ellyda & Marquinhos”.<br />
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Toni ficou de coração partido. Como podia? Ele nem a conhecia, e já estava se deixando abalar por uma notícia óbvia. Claro que uma mulher perfeita como aquela só podia ser comprometida! Mas, “Marquinhos”? Nem mesmo nome de homem ele tinha. Toni se sentia traído. Quis levantar, tomar as devidas satisfações, e quase o fez. Ela não tinha direito! Mas ele se conteve. Não suportando a dor, Toni resolveu voltar para casa. Foi chorar sozinho, pelo fim do relacionamento que jamais começou.<br />
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Era uma bela manhã de Sol. Ellyda acordou disposta, e seguia rumo à praia, que parecia lhe chamar. Com seu belo corpo negro, chamava a atenção de todos os homens e a inveja das mulheres, por onde passava. Incomodada, levou sua cadeira de praia bem para frente, onde, quando sentada, não seria vista por mais ninguém.<br />
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No entanto, um jovem rapaz a olhava diferente. Não a comia com os olhos, como o fazia a maioria dos homens. Ele parecia, mesmo, encantado. Isso a tocou sobremaneira. Mas, tímida, não teve coragem de iniciar um diálogo. Tomou em mãos um pequeno graveto, e pôs-se a escrever o seu nome na areia. Após as primeiras letras, o mar apagou. Poxa vida! Ela levantou-se, a contragosto. Não queria ser, novamente, alvo dos olhares. Gostava de se sentir bela, de usar um biquíni mínimo que destacasse as suas curvas, mas não se acostumava com a natureza dos olhares.<br />
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Pôs, então, a cadeira mais para trás, afastando-a do mar por mais alguns metros. Se tinha que fazê-lo, por que não aproximar um pouco da cadeira do rapaz? O álibi era perfeito, e ela o fez. Recomeçou a escrever seu nome, na esperança de que o jovem o lesse, e ele parecia mesmo interessado. Mas, aí, veio um ambulante desastrado. Ela quis explodir de raiva. Será que tinha de ser tão difícil, para uma moça, escrever um nome na areia?! Mas ela se conteve, afinal. Ela não queria que o rapaz pensasse que ela era esquentada. Após oferecer metade de suas mercadorias, num exagerado pedido de desculpas, e após ouvir sucessivas negativas, o ambulante saiu, olhando para trás, devorando-a com os olhos e pedindo desculpas.<br />
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Ela reiniciou, escrevendo as primeiras letras de seu nome. Só para confirmar o interesse dele, deu uma olhada rápida para o lado, e ele desviou o olhar. Poxa! Ela não devia ter olhado. O negócio era torcer que ele não estivesse tão intimidado, e que lesse o nome dela. Não demorou tanto em escrever o resto do nome, mas caprichou na caligrafia. Queria impressionar.<br />
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Mas, então, chegou uma garota. Ela era linda, loira, tinha o corpo perfeito. Era do jeito que homem gosta, cheia de carne, durinha, malhadinha. E era loira. Ellyda estava cansada de ver, por experiência própria, que os homens costumavam preferir as loiras. Ela não podia competir com uma mulher tão bela. Prontamente, decidiu escrever outro nome de homem, junto ao dela, para não dar na vista que estava paquerando o cara. Ela não suportava a ideia de que percebessem que ela foi rejeitada. De novo! Na falta de um nome melhor, escolheu o do seu irmão, de sete anos. Estava tão nervosa, que mal se deu conta de que escrevera no diminutivo. E com uma caligrafia sofrível.<br />
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Quando a loira se despediu, o convidou para ir a uma boate, e ele garantiu que ligaria. Se eles não tinham algo, logo teriam, certamente. E Ellyda teve certeza de que tinha tomado a decisão acertada, ao escrever aquele nome masculino ao lado do seu. Pena. Ele era exatamente como ela gostava. Bonito, mas nada escandaloso. Não era marombado, como aqueles caras que só pensam em academia e arranjar briga, e deixam a mulher em segundo plano. Ela gostava de rapazes assim, em forma, mas magrinhos, e com aquela cara de CDF. Costumam ser mais sensíveis, companheiros, apaixonados.<br />
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Quando ele viu o nome escrito, ela não coube em si, de tanto espanto. A expressão dele caiu, desabou. O corpo dele perdeu o vigor. Ele pareceu realmente decepcionado. Por um instante, pareceu irritado. Mas, ficou nisso, mesmo. Logo, ele recolheu o pouco que levara à praia, e partiu. Ela teve certeza de que se arrependeria depois, por não tê-lo chamado, nem puxado assunto. E se arrependeu. Fazer o quê?<br />
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<div align="right"><em>Pablo de Araújo Gomes, 11 de março de 2010</em></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-76534621956437264972010-02-19T18:07:00.000-08:002021-10-01T11:09:01.710-07:00Crônica Atravessada<div><div> Enviaram-me uma breve provocação, citando um estudioso francês que muito teria se interessado pela literatura eminentemente brasileira. O pedido para que eu me pronunciasse a respeito me pareceu bastante digno de atenção. O que não sei é se minha pronúncia será digna da solicitação...<br />
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É bem verdade. <i>Ferdinand Denis</i> apaixonou-se pelo Brasil, em uma viagem que fez à América do Sul, e passou a se interessar por tudo o que se relacionava com nosso país. Por mais de sessenta anos, para se ter idéia, escreveu inúmeros títulos, incansavelmente, sobre o nosso país.<br />
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Ferdinand nasceu em fins do século XVIII, exatamente na época do ano em que o então jovem general Napoleão Bonaparte investia contra o Egito e vencia a lendária Batalha das Pirâmides. Em outras palavras, a Revolução Francesa estava se consolidando, com o controle dos conflitos internos e das guerras em que a França estava envolvida. Isto, logo após o período conhecido como o Século das Luzes, que teve fim nove anos antes, com o início da própria revolução. Conforme deveria acontecer, ele foi um homem de seu tempo, afinado com as mais avançadas teorias da sua época. Da sua época, eu disse. Há muita coisa, que, há muito tempo, já foi desbancada.<br />
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Mas vamos por partes, como nos ensina o método. Ferdinand Denis de fato registrou muita coisa, não apenas sobre nossa literatura, como sobre nossa história, costumes, e sobre a nossa gente. Livros didáticos por ele escritos (lá, da França) foram adotados aqui em nossas escolas, durante o Segundo Império. Recebeu duas comendas imperiais por sua contribuição ao estudo da história e cultura brasileiras. E jamais vou desbotar seus méritos. Ele era realmente apaixonado pelo Brasil, e muito bem intencionado. Mas, estava enganado em muito do que disse.<br />
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A começar com as teorias sobre as qual se fundava seu pensamento. A primeira, a <i>Teoria dos Climas</i>, de <i>Montesquieu</i>, foi, por definitivo, superada, no século XX. O Sociólogo <i>Pierre Bordieu</i> foi um dos que demonstraram que era mais um mito revestido de caráter científico, como tantos outros.<br />
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E nem precisávamos esperar tanto, se usássemos a lógica. A <i>Teoria dos Climas</i> propugna, em resumo, o seguinte: que os povos do hemisfério norte do planeta terra, por viver em clima temperado, habitualmente mais frio, força mais freqüentemente a contração dos músculos (por conta do próprio frio), e assim se gera um caráter mais disposto e trabalhador; ao passo que os habitantes do hemisfério sul, por viverem predominantemente entre os trópicos, num clima mais quente, crescem relaxados, lentos e preguiçosos, formando-se um caráter claramente indolente. O que há de errado nesta teoria? Comecemos do começo: onde estiveram as primeiras grandes civilizações? No crescente fértil. Onde fica o crescente fértil? Nos pólos? Tudo bem, que apenas o Alto Egito ficava entre os trópicos, mas, ninguém pode dizer que qualquer das primeiras grandes civilizações estivesse sob clima fresco e ameno. Egito, Mesopotâmia e os demais povoados desta região, passando pela área da Palestina, viviam em oásis, o que é certo. Mas, por definição, Oásis ficam no meio do deserto. Era quente. E a disciplina invejável e incansável dos orientais também é presente entre os trópicos, não apenas na região temperada. A suposta indolência é muito mais cultural e de índole. Ou pretende me dizer que não há <i>playboys </i>na Europa? No mais, estou louco por uma oportunidade de ler os escritos de <i>Bordieu</i>, para saber como ele desmanchou esta teoria tosca que ajudou a fundamentar inúmeros preconceitos no decorrer da história.<br />
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Denis também defendia o uso do índio como meio de termos os nossos próprios heróis nacionais. Mas, parecia indiferente ao fato de que o índio de nossa literatura não era um índio, mas um cavaleiro medieval travestido de índio. Isto, na realidade, jamais valorizou o índio, de verdade, porque não era o nosso índio quem tinha aqueles valores. No fundo, tanto endeusar como demonizar termina fazendo mal, de alguma maneira.<br />
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Ele defendia, também, que, devido à natureza preguiçosa e indolente do povo brasileiro, nossa produção literária deveria investir mais em descrições, porque nos exigiria menos esforço. E, como a natureza e as cores dos trópicos são exóticas e exuberantes, esta seria, também, a melhor maneira de se prender a atenção dos leitores europeus.<br />
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Ora, que se dane a suposta natureza preguiçosa e indolente! O brasileiro tem essa fama, não é? Mas, pesquisas da Organização Internacional do Trabalho indicam que o povo brasileiro, entre os Estados Democráticos de Direito, é um dos que mais trabalha, no mundo. No japão, antes de a crise internacional expulsar os brasileiros de lá, nossos conterrâneos eram os prediletos das empresas. Não é que o japonês nato não trabalhasse. Sair mais cedo é uma vergonha, então, eles fazem serão até mais tarde, tomando um cafezinho, ou um chá, e conversando. O serão do brasileiro é trabalhando.<br />
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E, se a capacidade intelectual do brasileiro não fosse boa, mesmo, não teríamos inúmeros profissionais de referência no Vale do Silício, ou na NASA, por exemplo. Nossas mentes brilhantes evadem-se de sua pátria, como que despidos de qualquer sentimento nacional, mas porque as melhores oportunidades ainda estão no exterior. Se assim não fosse, e nossa educação efetivamente contribuísse para o aproveitamento dos talentos que despontam em nosso país - não o digo por patriotismo, que não é o meu forte -, com certeza, o Brasil teria um destaque maior no mundo. Aliás, isto vale para o Brasil, e para os países africanos, também. E os países pobres da Ásia, ou nossos vizinhos das américas. Por que Cuba se destaca em tantas modalidades? Saúde, educação, literatura, música, etc. Primeiro, porque valorizam sua educação. Segundo, porque fecharam as portas para a evasão de divisas intelectuais. Não estou concordando com os métodos de Cuba ao falar do fechar as portas como vantagem. Mas, não se pode negar que, para a coletividade, a medida ajuda, e muito, o país.<br />
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E, tem mais. Não temos que agradar o público europeu, ou qualquer outro, para sermos bons. Nosso aprimoramento, o lapidar de nossa arte deve ser feito sobre nossas características próprias, agradar a nós mesmos, como público. Não proponho que nos fechemos, ou que não deixemos vir de fora, ou sair o que é nosso. Mas, como poderemos fazer algo genuinamente nosso, se obedecemos a padrões e opiniões alienígenas? Não. Influência de fora é possível, porque cultura e estímulos externos enriquecem a capacidade criativa. Mas, se você tem uma cultura própria, e ela lhe agrada, use-a. No Brasil, há uma cultura riquíssima que muito tem se perdido, que é a dos bons e velhos <i>contadores de estórias</i>. Isto é uma arte, e é narrativo, não descritivo. Na formação de nosso país, também, vieram muitos poetas medievais, e seus descendentes, isolados em regiões afastadas ou até inóspitas, eternizaram o gênero de seus antepassados. Tudo isso e muito mais compõe a riqueza e o caminho das pedras que nos pode conferir alguma identidade. Se fizermos bem feito, terminaremos por atrair os olhos do mundo, de qualquer maneira. E será muito melhor, porque agradaremos com algo nosso, e não por tentar agradar.<br />
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Mas, nem tudo são espinhos. Denis também afirmava que o povo brasileiro é muito criativo. Ele já via isto naqueles tempos, e é algo que nós não perdemos. Não é bem por ser algo elogioso, mas admito que ele acertou. Como disse, ele estava enganado sobre muitas coisas. Mas não foi à toa que ele se apaixonou.<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 19 de fevereiro de 2010</i></div></div></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-61231473536225504742010-02-19T11:14:00.000-08:002021-10-01T11:09:04.169-07:00O Complexo Simplício Seu nome é Simplício Pessoa. Para os que o conhecem, isto é uma piada. Simplício é boa gente, uma pessoa tranquila como ninguém. Mas, de simples, não tem nada! Ele não se incomoda com isso, claro. Não se incomoda com nada - o dalai lama se irritaria mais facilmente do que Simplício Pessoa. Habilidade, que talvez tenha aprendido ao conviver com o seu irmão gêmeo, o <a href="http://prosaerrante.blogspot.com/2010/01/silvestre-pessoa.html">Silvestre</a>. Mas aguardar que ele tome qualquer decisão pode ser um verdadeiro suplício. Jamais faça isso, sobretudo se tiver pressa! Não permita que ele tenha duas ou mais opções, pois ele não decidirá enquanto não houver realizado uma completa análise de cada mínima variável ou fator envolvido. E ele não estará nem aí para a sua pressa. Ele não conhece o significado da palavra aborrecimento.<br />
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Você pode até duvidar, mas Simplício se gaba de fazer sempre a escolha certa. Também, pudera. Pensando tanto, assim, dói fazer a escolha errada. Às vezes, no entanto, o preço parece alto. Sua última decisão foi tomada sob a pressão e os olhares incrédulos de sua mais recente namorada. Ela impôs a sua sentença: "Ou o cigarro, ou eu!". E ainda se aborreceu, como se não conhecesse o Simplício. É claro que ele demorou uma eternidade para responder, e cada minuto a fez avermelhar-se mais de raiva. Quando ela estava já roxa, ele ofereceu o seu veredicto: se ela quisesse fazê-lo parar de fumar para o bem dele, ou seja, pensando nele, é porque o amava, e não o deixaria, no caso de ele não parar de fumar; já se a tentativa fosse para satisfazer alguma necessidade pessoal, ou, pior, ao próprio <i>ego</i>, ela não mereceria tal sacrifício. Em outras palavras, disse-lhe que não poderia largar o cigarro por uma pessoa que se declarava disposta a abandoná-lo.<br />
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Tudo bem, Simplício. Certo, mais uma vez. Mas, ela o largou, sem mais, após deduzir que ele optara pelo cigarro. Mas o seu argumento não afirmava que ele continuaria fumando. Enquanto ponderava, percebeu que fumar não tinha sido uma decisão, mas uma imposição que lhe haviam feito na juventude. Ele, como sempre que pensa, tomou a decisão acertada: largou o cigarro, e nunca mais fumou. A namorada? Ela bem que quis voltar, mas ele viu que, como ele suspeitava, ela não o queria tanto quanto ele achava que merecia ser querido. Nem se aborreceu.<br />
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A vida para Simplício é assim. Uma constante partida de xadrez. Você sacrifica a rainha para salvar o seu rei, e faz um xeque-mate com o peão. Cada escolha tem um fundamento, e nada é simples, nem óbvio. Pense bem, sem se deixar levar pela emoção, e você fará a escolha certa. Este é o lema do complexo Simplício.<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 20 de Janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-27798730629283088092010-02-12T06:07:00.000-08:002021-10-01T11:09:07.838-07:00O Difícil Caso de Amor entre Gui e seu Andróide<span class="Apple-style-span" style="white-space: pre;"> </span>Gui.<br />
<div><span class="Apple-style-span" style="white-space: pre;"> </span>Todo mundo conhece Gui.<br />
<div><span class="Apple-style-span" style="white-space: pre;"> </span>É um cara sociável, calmo, tranqüilo. Gui é um sujeito da paz, como se diz por aí. Mas, há alguns dias, tem feito loucuras, como ninguém jamais imaginou que ele fosse capaz. Tudo por amor, lhes asseguro! Tudo por amor.</div><div><span class="Apple-style-span" style="white-space: pre;"> </span>Corre, aliás, pela cidade, o boato de que ele acaba de ser internado num hospício. Ou num asilo psiquiático, como alguns têm preferido chamar. Bem, seja asilo, sanatório, clínica psiquiátrica ou hospício, bom auspício não é para o pobre Gui, ser interrado num local como este, já que isto somente vem a agravar a causa de sua suposta loucura.</div><div><br />
</div><div><span class="Apple-style-span" style="white-space: pre;"> </span>Todo este drama começa, senhores, na quinzena passada. O pai de Gui, desejoso de lhe dar um presente de aniversário sem precedentes, deu-lhe Angina_Nº1, a última novidade em robótica e produção de andróides, com aparência extremamente fiel à humana. O modelo recebeu este nome porque, apesar do avanço da tecnologia, andróides ainda são, naturalmente, pesados, e, numa fase inicial dos testes o então não-nomeado robô caiu sobre o seu criador, deixando-o preso sob todo o seu peso. No lançamento oficial do modelo, ele chegou a declarar: "Este andróide é de tirar o ar, vocês vão ver!"</div><div><span class="Apple-style-span" style="white-space: pre;"> </span>De tirar o ar, mesmo. O riquíssimo pai de Gui quase desistiu, ao saber o preço. Mas, seu filho havia passado no vestibular, e já tinha um carro. O que lhe dar de presente. "Nada!", disse a mãe do rapaz, "Ele não fez mais do que sua obrigação!". Mas não seria o pai de Gui, se não lhe desse algo. Não sabia o quanto se arrependeria por tomar uma decisão tão temerária!<br />
Ao ver Angina, foi exatamente isso que Gui sentiu. Sentiu apertar-lhe o peito, faltar o ar. Seu coração quase parou de bater. Foi amor à primeira vista. Quando seu pai lhe disse que aquela moça não era tímida, mas um robô desligado, já era tarde demais. Gui, encantado que estava, já não tinha ouvidos para mais nada. Agradeceu o presente, e a levou para o quarto. Carregou sua bateria na tomada do ventilador, e a ligou. Por algum descuido, talvez, levou um choque, em algum lugar. Teve certeza de que Angina é uma garota chocante, e começou a rir. Programada a aprender com as reações humanas, Angina reproduziu seu gesto, rindo às gargalhadas. Gui sentiu no ar um agradável clima de cumplicidade. Ela era, mesmo, encantadora.<br />
Olhando direito, para Angina, com aquele olhar já apaixonado, Gui não podia acreditar. Ela o observava com a mesma expressão. Talvez, fosse apenas porque é programada a aprender com os humanos, claro. Seu pai já lhe alertara a respeito. Mas ele teve a clara convicção de que ela lhe retribuía o amor que ele por ela sentia. Levou-a para apresentá-la ao pai, que a cumprimentou, friamente, tão-somente para programá-la. Gui ficou sentido. Angina não sabia exatamente qual dos dois deveria imitar: o seu dono ou aquele que com ela interagia. Pela primeira e última vez em sua "vida", se é que assim se pode chamar sua existência funcional, ela escolheu pelo critério da interação. Isso não viria a se repetir, porque os seus sensores detectaram a grande insatisfação e Gui.<br />
Talvez fosse melhor com sua mãe. "Mãe, esta é Angina.". Com desdém, a genitora olhou de lado, e não deu atenção ao androide. "Mãe?", "O que é, meu filho?", "Esta é Angina". Silêncio. "Mãe?", "O que é que você quer? Que eu converse com um robô?". Angina, definitivamente, programaria sérias restrições a apresentações e cumprimentos.<br />
E, assim, Gui teve o cuidado de ensinar tudo o que podia a sua amada. Ensinada sobre seu universo particular, ela parecia pronta para ser apresentada aos seus amigos. Alguns a acharam muito fria. No sentido de comportamento, claro. O funcionamento dos circuitos e mecanismos a mantinha agradavelmente aquecida. Poucos de fato notaram se tratar de um andróide. Muito sensuraram Gui, porque ele a apresentava como sua namorada! Os demais afirmavam que ela parecia ter sido feita para ele. Ele não negava de todo tal afirmação, pois ela fora, mesmo, feita sob encomenda. Toda a produção era feita sob encomenda, e com aparência personalizada. O pai de Gui usou critérios próprios para definir como ela seria, mas teve o cuidado de acrescentar detalhes que conhecia sobre a opinião do filho.<br />
Mas, certa vez, caiu uma chuva. Angina suportava chuvas, e o contato moderado com água, sem problemas. Mas a chuva foi muito intensa. "A precipitação do dia superou em muito os milímetros esperados para todo o mês", declararam os meteorologistas. E Angina não estava pronta para ter água acima de sua sinuosa cintura. Vazou água para dentro de Angina, e os circuitos pifaram. Sem poder se defender, e muito pesada para ser protegida por Gui, ela foi arrastada pela correnteza. Gui culpou os céus por sua perda, como costuma fazer quem perde o grande amor de sua vida. Buscou por ela em toda a parte, mas era tarde. Ele ficou inconsolável.<br />
Após semanas, ela foi encontrada em um mangue, próximo do encontro do rio com o mar.<br />
Gui não pensou duas vezes: foi ao encontro de sua amada! Ela estava muito danificada. Seu pai pensou que talvez fosse melhor, que talvez isto desfizesse o encanto. Mas o verdadeiro amor é incondicional. Gui a levou para a fábrica, para ser reconstituída. Declararam perda total, e ofereceram-se para construir uma nova. Gui perguntou se trocariam o amor de suas vidas por outra, somente porque ela estava em coma. O agrumento foi forte, pois um dos cientistas responsáveis pela criação tinha uma esposa em coma havia dois meses. Mas, claro, argumentaram que ela era um robô, um objeto, algo plenamente substituível. Arrependeram-se pelo dia em que nasceram.<br />
Indignado, Gui saiu pelo mundo para encontrar algum cientista disposto a encarar o desafio de "ressuscitar" Angina. Mas sua tecnologia era muito avançada. Algumas empresas concorrentes ainda pediram para analisá-la, com o objetivo não declarado de estudar a possibilidade de entrar no mercado com um produto concorrente. Mas não puderam compreender exatamente todos os seus inovadores mecanismos.<br />
Após meses, Gui já não comia, não saía de seu quarto, não se banhava, não se cuidava. Queria morrer com Angina em seus braços. Bem, na verdade, Angina era muito pesada, então ele queria morrer nos braços de Angina.<br />
No auge de seu desespero, os pais de Gui o internaram numa clínica. Como se recusa a comer, ficou no soro. Como queria sempre retirar o soro, permanece dopado. Mas em seu olhar distante não parece perder de vista o sonho de encontrar Angina, viva e funcionando bem, para que ela acabe com sua dura dor no coração.<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 12 de fevereiro de 2010</i></div></div></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-32772018276075252282010-02-05T04:25:00.000-08:002021-10-01T11:09:15.069-07:00O Inferno de Cada Um - II - AAAAAAAAAAAHHH!!<br />
Ouviu-se aquele grito ecoar por segundos, ainda, após ser proferido. E aquele grito de desespero não cessou, internamente, quando ela perdeu o restinho de seu fôlego. O que seria aquilo? Sentiu-se uma monstra, ao olhar no espelho. Que coisa horrível! Horrenda! Era... era... uma espinha!<br />
Procurou, inutilmente, o seu creme para espinhas, mas não o encontrou. Tentou espremer aquela medonha -e nojenta - bola de pus, não importava o quanto lhe doesse. E doeu. Doeria ainda mais se fosse vista daquele jeito. Mas não é possível! Quanto mais ela mexia, mais a espinha crescia. Num dado momento, crescera tanto, tão vermelha e inchada, que sua pele não pôde suportar a pressão. Estourou. Ela conseguira o que queria. Estava nojento, todo aquele pus, mas ela o lavava, e...<br />
- AAAAAAAAAAAAAHHHH!!<br />
No lugar da espinha, havia outra. igualzinha àquela. Só podia ser um pesadelo! Gabava-se de nunca ter tido espinhas, mesmo durante os piores momentos da puberdade e adolescência. Já distratara colegas feias, ou as belas que se surpreendiam com espinhas "horrendas" na face. Não que as tenha tratado mal, de fato, mas o seu ar de superioridade era notável e irritante. Ela sabia que era a garota mais bela, aonde quer que fosse, e os meninos sempre babavam por ela. Inclusive os mais belos.<br />
Mas, agora se sentia uma criatura mítica, um ogro, talvez! AQUELA espinha era a maior e mais horrenda que já vira. em toda a vida. Tinha que sair do banheiro. Resolveu ligar para a farmácia. Pôs a mão no rosto, com vergonha não se sabe de quem, e saiu pela porta do banheiro.<br />
Estaria ela enlouquecendo? Cruzando o portal, ela voltava ao banheiro, como se viesse de fora. Voltou, e percebeu que entrava, novamente, no banheiro. Voltou, e não saía do banheiro, como houvesse um banheiro idêntico ao seu, de cada lado da porta. Ela choraria de desespero, se não soubesse que isto a envelhecia tanto.<br />
Respirou fundo. Resolveu dar continuidade ao seu ritual diário de beleza. Cremes, massagens faciais, tudo precisava ser feito, ainda. Pegou seu creme anti-envelhecimento. Aquele era o seu predileto. Milagroso, e combatia seu maior terror, desde que entrou para a terrível e temida casa dos trinta e poucos anos. Aplicou, cuidadosamente, fechando os olhos, para tentar abstrair a inconveniente espinha. Mas, algo estranho quis lhe abrir os olhos. A textura de sua pele mudara e, ela resistiu a abri-los. Para seu total pânico os olhos denunciaram seu mais triste pesadelo. Ressoou mais um grito de desespero.<br />
Onde ela houvera passado o creme, sua pele envelhecera décadas, em segundos. Enrugara a pele, ressecara a tez de sua bela face. Não pareceria mais nova de que a sua própria avó, com mais de oitenta anos de idade. Idade, aliás, que dispensava alcançar, se porventura não pudesse evitar a aparência que tomava por degenerada. Não podia piorar. Não havia como.<br />
Mas, piorou! No lugar da espinha, o pior estigma da feiúra. O maior terror de seus pesadelos mais íntimos, a única coisa que seria capaz de superar uma espinha: uma grande e destacada verruga! Era, definitivamente, pior do que a morte! E tinha, até, cabelo! tentou arrancar o cabelo com a pinça. Pegou uma lâmina, para removê-la, mas temeu que lhe acontecesse algo pior à sua face, já deformada.<br />
Pensou, novamente, no que pensara anteriormente. Era pior do que a morte. Sim, era isso! Percebeu que este pensamento não lhe viera à toa. Compreendia, então, que tudo só poderia ser um castigo. Olhou para a porta do banheiro, e finalmente viu o seu quarto, apinhado de gente. Não teve coragem de cruzar a porta, embora sentisse que poderia sair do quarto. O seu temor era ser vista pelos presentes, naquele estado.<br />
O que tanto fotografavam, aqueles jornalistas intrometidos? O que poderia haver de tão interessante em sua cama? Algum comentou, jocosamente, que poderiam vender as imagens para Hollywood, para os filmes de terror voltarem a assustar alguém. Outro o sensurava, porque não estariam em local ou ocasião para brincadeiras. Não haveria ocasião mais inconveniente, mesmo. Ela pedira por aquele triste fim, mas, após a morte, merecia um pingo de respeito que se lhe pudesse dar.<br />
Ela não resistiu. Cobriu a face, e entrou no quarto, onde viu que, realmente, havia algo sobre a cama. Abafou um grito, para não chamar atenção para si, ao reconhecer sua camisola rasgada, que exibia um corpo deformado sobre a cama. Havia alguém, cuja identidade resistia em reconhecer, ou aceitar a identidade que lhe atribuía. Mas não podia mentir para si, mesma. Começava a entender. Ninguém a veria, simplesmente, porque ela não estava ali. Estava morta. E, muito pior do que ela, estava o seu corpo, sobre a cama, o corpo deformado, a face disforme, irreconhecível, realmente dignos de filmes de terror. Ouvia aqui e ali. Houvera sido vítima de um crime passional.<br />
Sabia que não deveria ter confiado naquele homem, mas ele era tão lindo. E o homem mais lindo era o adorno perfeito para a mais bela mulher da cidade. As mulheres, com certeza a invejavam, quando ela desfilava com ele a tiracolo. Certamente, não mais invejariam, agora. Sentiu alguma pitada de vergonha. Não conteria mais o choro, neste momento não houvesse percebido que, enquanto parecia estar invisível a todos os presentes, um rapaz encostado na porta do quarto a observava.<br />
Como ele era feio! Causava-lhe asco somente a visão daquele arremedo de homem, que não tirava os olhos dela. Com um sutil gesto, como se pudessem ser vistos por mais alguém, ele a chamou para si. Não podendo recorrer a mais ninguém, ela resistiu a seu nojo, e andou em sua direção. Pensava todo o tipo de interjeições, ao olhar aquele rosto estranho.<br />
- Você, por acaso, já se viu no espelho, para estar me julgando assim?<br />
Ela ficou estatelada. Ele lera seus pensamentos? Ou será que sua expressão de nojo era tão clara, que transparecia seus pensamentos?<br />
- O que?<br />
- Quer sua vidinha tola de volta?<br />
Ela ficou séria. Parecia uma espécie de brincadeira de mal gosto. Mas ele permanecia sério, diante dela.<br />
- Você pode fazer isso?<br />
- Ainda está em tempo de reverter tudo.<br />
- VOCÊ - e destacou cada sílaba de sua frase - pode fazer isso?<br />
- Se VOCÊ fizer um trato comigo.<br />
- Qualquer coisa!<br />
- Tenha calma. Vou fazer de conta que não ouvi. Não se comprometa antes de saber o preço do que almeja...<br />
- Como assim? - ela estava, mesmo, intrigada.<br />
- Você faria, mesmo, qualquer coisa pela sua vida?<br />
- Qualquer coisa! - ela insistia em responder sem pestanejar.<br />
- Namore-me. E este compromisso deverá ser publicamente assumido. Você é uma pessoa pública, quero que convoque a imprensa, e cada revista de fofoca para me exibir como seu novo parceiro.<br />
Já entre as primeiras palavras, ela assumira, novamente, a expressão de total rejeição. Mas encararia. Mas, a idéia de assumir publicamente um relacionamento com uma coisa tão feia. Ela viraria piada pública.<br />
- Deus me livre! Jamais!<br />
- Ele livraria! Se você aceitasse, claro! Mas, você disse o que eu queria ouvir.<br />
Como num passe de mágica, ele se transformou no homem mais belo que ela já vira. Algo de familiar... Era ele! Ele a matara!<br />
- Você selou o seu destino. Somente sairá daqui, quando entender o real sentido da palavra beleza! Cuide-se!<br />
Antes que ela pudesse respirar, percebeu que estava numa sala enorme. Havia espelhos em cada parede, havia espelhos em cada coluna. Uma verdadeira academia, uma penteadeira, inúmeros produtos de beleza e equipamentos afins. E espelhos. Muitos espelhos. Ela via que era ela, em cada espelho. Mas cada espelho mostrava uma face diferente, como estivesse diante de espelhos que a distorcessem. Mas não a distorciam, não, e ela entendeu isso. Era ela, mesma, como ela realmente era.<br />
É que, a cada espelho, ela via um defeito seu. Não espinhas, verrugas, rugas, pés-de-galinha... Não. Via sua soberba, sua empáfia, sua inveja, sua desonestidade. O maior dos espelhos, sua vaidade, mãe de cada um de seus defeitos.<br />
No fundo, sabia que, se, um dia, conseguisse ver a mulher por trás daquele monstro horrendo que cada espelho abrigava, se abriria alguma passagem para onde ela pudesse ter paz, finalmente. Mas, por um bom tempo, ela estava aprisionada pelo mais terrível dos monstros: ela mesma.<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 20 de janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-64145025323938045232010-01-26T12:22:00.000-08:002021-10-01T11:09:22.931-07:00Sabores "Doce". Há palavra mais doce, quando queremos qualificar algo agradável ou alguém gentil? Decerto que não. Está na boca do povo, é preferência nacional. Já ao desagrado, o chamamos de azedo, de salgado ou, pior, de amargo.<br />
Entre estas belas figuras de linguagem que enriquecem o nosso idioma, oculta-se um engano comum. Nem tudo que é doce é tão agradável, como nem tudo que diz respeito aos demais sabores causa desgosto. De fato, os doces são os preferidos de onze entre dez crianças, regra de rarississíssimas exceções. E é o instinto do Homem falando. Na natureza, onde o alimento era escasso, uma fonte tão rica de energia (os açúcares) não poderia jamais ser desprezada, e nosso organismo aprendeu isso muito bem. Aliás, o mesmo vale para gorduras e demais alimentos calóricos, o que explica porque tudo o que é gostoso faz mal ou engorda, como diz o velho ditado! Mas isso é outro assunto.<br />
No entanto, os doces nem sempre gozam da mesma popularidade entre os mais crescidinhos. É só reparar nas festinhas de suas crianças: enquanto a criançada se esbanja na mesa de doces (ou fica babando, enquanto o consumo ainda não foi liberado), os convidados adultos não tiram os olhos das coxinhas, os bolinhos de chuva e os demais salgados. Se fôssemos justos, então, um preço salgado talvez devesse ser o mais procurado pelos adultos, não o mais caro. Por outro lado, justiça seja feita, quem gostaria de ser definido como "sem sal"? Uma pessoa sem graça, sem gosto, que nem cheira nem fede, é o que quer dizer. Quer dizer, cheirar e feder já é invadir o reino de outros sentidos; atenhamo-nos ao paladar! Mas, afinal, pelo menos, reconhece-se algum valor no sal. Se bem que, pensando bem, sal, soldo, de onde vem soldado ou salário, são expressões diretamente relacionadas, no passado, com a utilização deste artigo - o sal - para a remuneração dos militares. Isso, quando a extração do sal era algo considerado árduo, poucos o conseguiam e, por conseguinte, este artigo ainda não havia deflacionado tanto. Talvez, naqueles tempos, "sem sal" fosse alguém liso. Quero dizer, liso, no sentido de duro. Ai, ai, lá vou eu, invadindo novamente o espaço de outros sentidos! Perdoem-me por esta breve confusão cinestésica! O que quero dizer é que, naqueles tempos, se havia esta expressão "sem sal", certamente designava alguém de recursos limitados, sem renda. Pobre, em outras palavras. Talvez, então - e isto é apenas uma suposição, sem nenhuma base científica -, ser "sem sal" tenha a ver com esta origem em que sê-lo era sem graça para quem gostaria de unir-se maritalmente com alguém mais "bem dotado". Sabe lá!<br />
E o amargor? Todos pensam no jiló, ou associam o amargo a este impopular vegetal que, pessoalmente, nunca tive o prazer ou desprazer de experimentar. Sobre este alimento, nada a declarar, portanto. Mas, que tal um cafezinho? Ou uma cervejinha? E o que você pensa do chocolate? Calma, tudo bem. O chocolate, no mais das vezes, é adoçado, é verdade. E o café, pela maioria das pessoas, também. Mas, e a cerveja? Principalmente a <i>pilsen</i>, que de doce não tem nada! E vou além! O chocolate já era sucesso absoluto em solos das américas, antes mesmo deste imenso continente ser conhecido por este nome. E não era adoçado, como, sem perder a popularidade, permaneceu por um tempo. E, tanto ele como o café ainda têm consumidores que adoçam pouco ou sequer adoçam. Você se surpreenderia, se passasse o dia em algumas boas cafeterias!<br />
O azedo, coitado! Um fato que azeda uma relação amorosa pode terminar levando um namoro ou casamento pelo ralo. Ou para o lixo, sem direito a reciclagem! Isso, porque o processo de fermentação que estraga os alimentos os deixa azedos, azeda-os. Entretanto, o azedume não tem que ser ruim. Que o digam os fãs da acerola, do limão, do morango, da coalhada, do abacaxi, das uvas roxas, etc e tal, só para ficar em exemplos. E, se aliado ao doce - olha ele de novo -, o azedo é ma ótima pedida! Na verdade, o simples inalar do cheiro de um alimento azedo conhecido tende a acelerar a salivação, mais do que de qualquer alimento seu predileto! Viva o azedo!<br />
Enfim, se mais ou se menos, não importa, realmente. O fato é que os sabores são magníficos, uma verdadeira delícia que precisa ser explorada. E a combinação dos sabores é como a combinação dos instrumentos de uma orquestra. Sei, sei, estou invadindo, novamente o terreno de outros sentidos. Mas que se dane! Talvez, mais que a predominância de um sabor sobre outro (o que é natural, e até positivo), o problema é a medida de cada sabor. O excesso ou a falta de sabor, aí, sim, é onde mora o problema! Sal demais numa refeição pode deixá-la intragável! Há um exame médico que usa uma grande dose de açúcares na forma líquida, cujo gosto termina por dar a muitos ânsia de vômito e outras sensações desagradáveis. Algo azedo demais, ou amargo demais, nada vai agradar! Isso, porque, além dos sabores, não falei de sensações complementares, como a refrescância da menta ou a picância da pimenta... Tudo demais pode ser ruim, mas na medida certa, é banquete garantido!<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 13 de Janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-12494843104437184882010-01-20T23:34:00.000-08:002021-10-01T11:09:27.037-07:00Silvestre Pessoa<div style="text-align: right;"><span class="Apple-style-span" style="line-height: 19px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: 'Helvetica Neue', Arial, Helvetica, sans-serif;"><span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">"Era um cidadão comum como esses que se vê na rua</span></span></span><br />
<span class="Apple-style-span" style="line-height: 19px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: 'Helvetica Neue', Arial, Helvetica, sans-serif;"><span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">Falava de negócios, ria, via show de mulher nua</span></span></span><br />
<span class="Apple-style-span" style="line-height: 19px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: 'Helvetica Neue', Arial, Helvetica, sans-serif;"><span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">Vivia o dia e não o sol, a noite e não a lua"</span></span></span><br />
<span class="Apple-style-span" style="line-height: 19px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: 'Helvetica Neue', Arial, Helvetica, sans-serif;"><span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: Tahoma, Geneva, Kalimati, sans-serif; font-size: 13px;"><i><span class="Apple-style-span" style="font-family: 'Helvetica Neue', Arial, Helvetica, sans-serif;"><span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">(Belchior)</span></span></i></span></span></span></span><br />
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<div style="text-align: left;"> Silvestre é um homem muito urbano. Não que ele seja gentil, simpático ou sociável, como se costuma querer dizer com este adjetivo. Muito pelo contrário, ele é urbano como são as grandes aglomerações urbanas de hoje em dia: frio, frenético e incansável.</div></div> Sua rotina de trabalho inclui os três turnos. Às vezes, os quatro, quando ganha um extra com algum bico na madrugada. Mas não reclama. Quer dizer, reclamar não reclama, mesmo. Mas ninguém mais turrão e mal humorado jamais foi visto em qualquer um de seus ofícios. Não cumprimenta ninguém,<br />
<a name='more'></a>nem é muito dado a elogiar. Paciência, então, não é lá o seu forte, e, de modo algum, é feito de tolo. Jamais! Coitado de quem o tentar.<br />
Outro dia, seu patrão se enrolou, não se sabe se propositadamente, com as contas das horas extras do Sr. Silvestre Pessoa. Deu-lhe a metade do devido. Não sobrou pedra sobre pedra, claro. Silvestre mandou às favas a hierarquia, e o patrão aonde não posso dizer neste texto. Pediu respeito, bem a seu modo, e terminou chamando a atenção de todos os empregados da empresa onde trabalhava. Isto fez seu chefe se sentir humilhado e o resultado é óbvio: demissão.<br />
Silvestre não ficou na rua da amargura. Foi, na verdade, se oferecer para fazer horas extras em seu outro emprego. Mas, seu orçamento sofreu um considerável baque. Era o seu melhor emprego. Mas já era! Tocou para frente, dinâmico, incansável, como sempre. E frio. Não tinha uma namorada, sequer. Nunca teve. E não é que fosse feio, ou que preferisse rapazes. Era lindo. No entanto, sua carranca sempre armada afugentava as garotas. E era hetero, mas nem as prostitutas, a quem pagava bem, aguentavam uma segunda vez. Era, na verdade, até pior que pagasse bem. Sentia-se dono delas.<br />
Seus colegas sempre tentam teorizar sobre seu comportamento. Normalmente, algum trauma é cogitado. Um pai que lhe batia, uma mãe que não lhe amava, um amor não correspondido, uma viuvez ou um filho perdido. Balela! Sua vida não fora sempre perfeita, é verdade. Mas nada tivera de extraordinário, que lhe pudesse ter feito tão mal. A verdade verdadeira é que sempre fora assim. Não há explicação aparente. A grande prova de que não foi sua vida ou criação é o seu próprio irmão, o <a href="http://prosaerrante.blogspot.com/2010/02/o-complexo-simplicio.html">Simplício</a>. Não há no mundo alguém mais tranquilo que o <a href="http://prosaerrante.blogspot.com/2010/02/o-complexo-simplicio.html">Simplício</a>, embora ele padeça de seus próprios problemas.<br />
As notícias que dele tive, recentemente, são de que foi readmitido no seu antigo emprego. Era o melhor e mais produtivo funcionário, apesar de isolado e tão pouco sociável. Enquanto ele trabalhar com tanto afinco, poderá seguir sem perder o emprego. E ir para a cama com a sensação de missão cumprida, ao menos por um dia.<br />
E segue sua vida mais que urbanamente, Silvestre Pessoa. Segue-a Metropolitanamente, esta pessoa nada silvestre, este Silvestre pouco pessoa.<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 20 de janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-86435080077428739282010-01-17T09:20:00.000-08:002021-10-01T11:09:30.622-07:00Ô, Glória! A moça se chamava Glória. Irmã Glória, é como era conhecida em sua igreja. Evangélica, recatada, certinha como poucas. E linda! Lindamente, linda, dos pés à cabeça. Não é que fosse vaidosa, porque ela não era, mesmo. Mas era de uma beleza exuberante, na simplicidade de suas eternas saias longas, seu cabelo escuro que, de tão escorrido, não se segurava preso. Fazia bem de estar sempre na igreja, porque, num pagode ou num baile <i>fanque</i>, ela seria o pecado em pessoa!<br />
E, com seu sorriso brilhante, cativava a todos, principalmente aos rapazes, que eram evangélicos, não santos. Aliás, a igreja não os aceitaria, se fossem santos, já que não acreditam em santos. Mas, como dizíamos, ela cativava a todos, principalmente aos rapazes, que pecavam em pensamento, e não o podiam negar. De certo modo, desistiram de negar. Iam mais cedo para a igreja, na esperança de conseguir um dedinho de prosa com a bela moça. Quando ela também chegava mais cedo, era amém pra todo o lado. Quem conseguia sua atenção só pensava em aleluia.<br />
E, quando ela passava, com seu rebolado feminino inevitável, sua natureza de bela mulher falava alto. E a natureza dos rapazes, que não conseguiam evitar um olhar indiscreto, também. Ver aquela beleza desfilar era uma bênção! Ô, glória!<br />
Ela, um dia, ouviu os rapazes em tal exclamação. Pensou que a chamassem. Bem, falavam dela, mas não necessariamente o seu nome. Mas não assumiram. Deram um sorriso amarelo, e disseram que falavam de outra coisa. Mentir é pecado, pensaram, mas orariam pelo perdão. Não podiam era assumir a razão de sua exclamação! Certa vez, ela até deu uma bola para um abençoado. Acho que o invejaram tanto, que não teve glória que subsistisse. E Glória o pôs de lado, como uma criança que enjoa de um brinquedo. Ele apelava: "ô, Glória, me deixa não!"; e os rapazes, vendo a reação da moça, comemoravam: "Ô, glória! Ela deixou!"<br />
Há quem diga que Glória se casou. Há quem diga que não. O fato é que nunca mais se ouviu falar em Glória. Mas, a cada exclamação, os rapazes ainda pecam em pensamento. Ô, Glória!<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 16 de Janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-78967908454725155722010-01-15T12:16:00.000-08:002021-10-01T11:09:33.031-07:00O Altruísmo Cego e o Consciente<div style="text-align: justify;"> Caridade.</div><div style="text-align: justify;"> A Idade Média e a Igreja Católica (conceitos que quase se confundiam) eternizaram esta palavra como uma das mais importantes e seguras portas para a salvação de sua alma. E, falando em espírito, muitos dos espiritualismos, inclusive sua mais completa e ilustre vertente (nada contra as outras correntes), o Espiritismo (de Allan Kardec) também valorizam a caridade como uma parte importante do caminho rumo à iluminação espiritual.</div><div style="text-align: justify;"> Hão de me perdoar os certinhos e os moralistas, mas acho que supervalorizam a caridade. Não, não sou o anti-Cristo! Não me venham crucificar, por favor! Eu disse que a caridade é supervalorizada, e é mesmo. Não disse que é ruim. Eu também a acho importante, e a pratico, se acaso vocês duvidam que eu a ache positiva. Isso, apesar de crer que muitos fazem um pequeno gesto de caridade, a boa ação do dia, apenas para ficar de consciência tranquila, e se eximir do dever de fazer algo realmente significativo que lhes dê mais trabalho. Não, não resistam às idéias que lhes trago. Leiam-me, e entenderão o que lhes digo.</div><br />
<div style="text-align: justify;"> Permitam-me fazer algumas citações: o Rei do Baião, grande mestre Gonzagão, já dizia "A esmola mata de vergonha, ou vicia o cidadão". Dispensaria comentários, só de se bem observar nas esquinas e semáforos de sua cidade. Mas, como reforço, lembro-lhes de <i>Antoine de Saint-Exupéry</i>, que fala, em uma obra sua de cujo título não consigo me lembrar, daqueles mendigos que expõem as suas chagas, para demonstrar que não têm como trabalhar, e que precisam de uma ajuda para se curar; mendigos esses que, no fim do dia, futucam suas feridas, e até lhes esfregam todo tipo de sujidade, para não perder sua fonte de renda.</div><div style="text-align: justify;"> Enquanto isso, a sabedoria popular ensina que é melhor ensinar a pescar do que simplesmente dar o peixe. Sobre isso, permitam-me lembrar que os comunistas de última hora há muito dizem: "Dar esmola atrasa a revolução!". Sim, é verdade. Sob a ótica de quem espera que o miserável, não suportando a miséria, faça a revolução, dar-lhe esmolas o coloca em uma situação de conforto, na qual, ainda que na miséria, não se tem com o que se revoltar. Muito sábia colocação! Parando de se dar a esmola, o sopão, o peixe, o pão, o miserável sai da zona de conforto, de dependência, e vai atrás do trabalho, ou se organiza com seus iguais para virar o jogo através da revolução! Ingênuo, não? Também acho, mas devo admitir que é bonito! Porém, não creio, também, que, sem nada para comer, na mais completa miséria, se possa pensar em algo mais do que a própria sobrevivência, quando muito na das crias. Sim, o bicho-gente também é animal! Então, não podemos abandonar por completo a caridade, mas temos que ter cuidado com a esmola. Esmola não é caridade, é veneno! E nem sempre dar esmola é dar uns <i>trocadinhos</i>, há muitas maneiras de se cometer este crime social. Há muitas outras citações, algumas bastante interessantes, mas, assim, não escrevo hoje!</div><div style="text-align: justify;"> Então, colocando as idéias esparsas em ordem, eu diria: é preciso eliminar a dependência, ensinando a pescar, não deixando, no entanto, que o aprendiz fique sem comer até o dia de sua "formatura" como pescador. Mas, tão logo aprenda, e tenha onde pescar (detalhe importante, como discorreremos), não se pode manter a ajuda, sob pena de provocar o vício da acomodação.</div><div style="text-align: justify;"> Certo. Mas, ainda assim, subsiste uma dúvida: como ser solidário? Devemos esperar emergências, como estes terremotos no Haiti, ou aquelas <i>tsunamis</i> de poucos anos atrás, na oceania? Por óbvio que devemos contribuir, e rápido, mas não. Não é a única maneira de agir. Há muito o que se fazer, por aqui, e já!</div><div style="text-align: justify;"> Acontece que, como vimos, dar esmolas a uma criança, no sinal, estimula que ela jamais tente, quando crescer, outra renda que lhe dê mais trabalho; comprar aqueles confeitinhos ou canetas, pior ainda, porque estimula a exploração infantil! Ou vocês realmente acreditam que aquela pobre criança (pobre, mesmo!) vai ver a cor do seu rico dinheirinho? Nem sonhem! Muito mais efetivo é procurar uma instituição séria, e acompanhar os trabalhos. Dar dinheiro à instituição? Pode ser, se você conhece e ela presta contas direitinho. Afinal, dinheiro também é necessário, e muito, para se manter funcionando. Mas, se você é bom com crianças, por que não passar o dia recreando crianças carentes? Ou uma tarde conversando com algum(a) senhor(a), num asilo, onde muitos são abandonados pela família e passam anos esquecidos, em sua infinita solidão. Ou, quem sabe, visitar um bom hospital do câncer e dar força a um paciente terminal, ou divertir uma criança; quem sabe abraçar um paciente com <i>hanseníase</i> (desde, claro, que esteja sendo tratado, sem risco de contaminação), após alguns minutos de boa conversação sobre frivolidades. Você não faz idéia da força que isso tem. Ou doar sangue, se sua saúde permite. E, se for doar algo a alguma família carente, que tal conversar com os membros desta família? Não são apenas receptáculos de sua boa-vontade: SÃO PESSOAS! Não posso lhes dizer que já fiz tudo isso, seria mentira. Mas já fiz alguns, e pretendo repetir a dose. Outros, faço-os com regularidade.</div><div style="text-align: justify;"> Parece-lhes que já falamos tudo? Se sim, o seu equívoco é grande!</div><div style="text-align: justify;"> Vamos imaginar uma situação hipotética: você acompanha uma boa instituição, que realiza a nobre obra de tirar crianças das ruas, e do risco iminente de caírem no mundo das drogas e/ou do crime. Ótimo! Isso jamais será pouco! E, jamais, será suficiente, também. É preciso que, ao crescer, e não mais poder ser atendida pela instituição, este novo adulto possa não ser apenas mais um miserável nas ruas. Aliás, esta cena é bastante comum, bem mais do que você pensa. "Nós até queríamos ajudá-lo mais, mas você já é bem grandinho. Te vira!", "Mas eu não tenho trabalho, nem onde morar...". Com sorte, a instituição terá ensinado o jovem a pescar, e, com sorte, tome-lhe a vara! Vá pescar por conta própria! "Mas este canal não tem peixe!", "Sinto muito, mas não podemos fazer nada por você". Infelizmente, na maioria dos casos, este jovem jamais teve uma formação semelhante à de uma criança da classe média. Às vezes, não passa nem longe disso. E, hoje, até para quem tem boa formação, tudo poderá ser bastante difícil.</div><div style="text-align: justify;"> Bem, chega de pessimismo! Queremos solução. Com um pouco mais de dinheiro, uma poder-se-ia criar um projeto menos pontual, mais amplo, que reestruturasse a comunidade, orientasse os adultos a formarem cooperativas de acordo com a vocação econômica local, a se organizarem, a progredirem, que facilitasse o crédito para a realização deste investimento. Deste modo, aquelas crianças se sentiriam inspiradas a, na medida em que crescessem, seguir o exemplo dos pais, tios ou conhecidos. Não seria mais esmola, não seria mais somente ensinar a pescar, num rio sem peixe. Seria dar semente, terra e orientação, e dizer: plante, que, em se cuidando, fruto dá!</div><div style="text-align: justify;"> Ah, você não tem esse dinheiro? Realmente, criar instituições como esta, com tal estrutura, depende de mais dinheiro do que para fundar uma ONG (Organização Não Governamental, entidade sem fins lucrativos que objetiva um bem social) qualquer. Pior, muitas empresas ou multimilionários têm acesso a idéias e projetos semelhantes, mas contentam-se em engavetar. Muito triste, não? Mas não tem que ser o fim do mundo, não! Por que as ONGs, e demais instituições que atendem um determinado município ou uma comunidade, não firmam parcerias para um trabalho mais coordenado e eficiente? Isso está ao alcance de muitas delas. É difícil? Claro! Realizar trabalho social é difícil, lidar com pessoas é difícil, e não deixam de fazê-lo, por isso.</div><div style="text-align: justify;"> O Homem (raça humana) produz e extrai mais do que realmente necessita. E desperdiça (ou acumula, graças à lógica capitalista) grande parte de tal produção, inutilizando-a, enquanto grande parte da população humana, paradoxalmente, passa fome e toda sorte de privações, em pleno século XXI. A verdadeira solução para resolver este problema, ou pelo menos minimizá-lo, não é a caridade, como muitos pensam. Enquanto pensarmos nisso, não funcionará. A caridade é um paliativo, um <i>assopro na ferida</i>. A solução está na cooperação, no mutualismo. Mas isso é visto como coisa de comunista, de anarquista, ou de qualquer outra corrente filosófico-social que não recebe o devido crédito por culpa do preconceito. Sopra-nos, então, assoprar as feridas, na ilusão de que isso, por si só, vá fazer mais do que aliviar o incômodo da eterna chaga.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 15 de janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-44141376620261461672010-01-10T17:22:00.000-08:002021-10-01T11:09:35.574-07:00Anatomia Feminina Minhas amigas têm me perguntado de maneira reticente, há anos, a mesma velha e desgastada pergunta de sempre. Pois agora vou responder, e bem respondido, para que não me venham mais com esta pergunta. De qual parte da anatomia feminina eu gosto mais?<br />
Antes de mais nada, deixem-me esclarecer um equívoco comum. De que parte eu gosto mais, é uma coisa; o que me dá mais tesão, aí já é outra. O que me atrai mais, é uma coisa; o que me excita é outra. Não me venham taxar de hipócrita ou adjetivos afins, quando eu, então, responder ao tão realizado questionamento.<br />
<a href="http://www.blogger.com/post-edit.g?blogID=7617139008838083798&postID=4414137662026146167" name="more"></a><br />
Não seria exagero dizer que, em momentos passados, eu responderia algo que confundiria estas diferenciações. Imaturidade da juventude, posso-lhes assegurar. Mas, hoje, já vejo com clareza o que há a ser visto. Vamos de trás para frente. Não na anatomia, mas na ordem das questões. Quero dizer, vamos do que se espera ouvir, e, depois, à resposta mais apropriada para a minha verdadeira opinião.<br />
Anatomia? Normalmente, nesta pergunta, não se quer saber de anatomia, mas de sexo. De que mais gosto? É até difícil responder... Eu me considero até versátil. Não sou podólatra, mas acho lindos os pés de uma mulher. Dos macios e delicados, da moça urbana aos feridos e calejados de uma bailarina, compridos ou pequenos, todos podem ter seu charme.<br />
Pernas! Adoro as pernas! Desde aquele tornozelo bem torneado até quando acabam, nas proximidades de... Ah, já repararam que os joelhos costumam ser diferentes, de pessoa para pessoa? Pois é. Até isso pode ser belo numa mulher. Quem diria? Os joelhos, sim! E as coxas! Aí, sim! Uma coxa bem trabalhada, torneada, dura, carnuda, enfim, uma perna feminina. Hoje em dia, há muitas espécimes de pernas basicamente masculinas nas mulheres. Sou obrigado a admitir que esta nova corrente não me agrada muito. Mas pode ter o seu valor, há quem goste.<br />
Subamos mais um pouco. Barriga, vocês conhecem? O terror das moças, e mais ainda das não-moças que não se dão com seus <i>anticoncepcionais</i>. Mas, hormônios à parte, o maior vilão da barriga é a alimentação inadequada. E haja coca-cola! Pois bem, que seja. Quem vive a ditadura da barriguinha malhadinha é modelo, gente! Não estou dizendo que não é bom uma barriguinha sequinha; eu, mesmo, ADORO! Mas, há muito mais a ver numa barriguinha! Há aquelas completamente lisinhas, as que possuem uma discreta camada de pêlos finos e delicados, e até as que literalmente mostram o caminho para mais em baixo. Com delicadeza e um pouquinho de cuidado, a barriga pode ser um charme, mesmo que não seja um tanquinho. Ouviram, meninas? Cuidem-se, mas não se envergonhem de suas barrigas!<br />
Ah, estou até tentando ser compacto e claro, mas não dá! Vou, agora, apenas listar. As costas de uma mulher, os ombros (sim, os ombros! Se não fossem belos, não haveria tantos modelos a exibi-los), pescoço, a face, os cabelos, a maçã do rosto, orelhas, os seios da face, os seios (ah, um bom decote!), enfim... tanta coisa! A anatomia da mulher tem um encanto único! Ah, e, para não soar hipócrita, vou dar uma atenção à preferência nacional. As nádegas. Popularmente conhecidas como bunda, bundinha, bumbum. Que seja! É muito bom, não nego! Mulheres que o têm, sois felizardas, agraciadas por um bem genético que a malhação até pode ajudar a compor, mas não constrói completamente! Gosto, sim. Mas, começando a responder às perguntas, apesar de toda a mulher ser bela e especialmente atrativa, eu tenho que admitir. Há uma certa parte do corpo da mulher que, honestamente me parece muito injustiçada!<br />
Sim, muitos já podem ter compreendido. Outros, não, talvez. Mas, que a púbis, quer dizer... a genitália feminina, ela mesma, tem uma péssima fama, a de ser feia, isso é verdade. O que não me parece justo ou verdadeiro é que mereça esta fama, que em minha opinião se dá em parte devido a valores sócio-culturais, em outra à vulgar exploração de sua imagem pela indústria da pornografia. Sobra pouco para opiniões majoritariamente estéticas. É bela, sim. Em vários ângulos. Em algumas situações, chega a ser como uma flor delicada, o órgão (ou conjunto de órgãos) mais complexo e completo que Deus ou a mãe Natureza deu a uma de suas criaturas. Eu esperava escrever este trecho com mais poesia, como o tema bem merece. Talvez, o sono não me permita. Mas, afinal de contas, falávamos, ainda, apenas de atração, apenas de tesão. Então, de que, afinal, mais gosto na anatomia feminina?<br />
Entendam-me, quando digo que tudo o que até agora disse foi uma resposta às objeções à minha verdadeira resposta. A parte da anatomia feminina de que mais gosto são os olhos! Sim, claro, os olhos! Não me venham dizer que não é o que primeiro olho. Fico louco de incômodo quando uma mulher me atrai, e está usando óculos escuros! Fico querendo vê-los muito mais do que, como <i>voyeur</i>, me interessa ver decotes ou um lance. Gosto de admirá-los, mesmo quando a garota não me interessa. Os olhos são encantadores, são belos e verdadeiros. Olhos que sorriem, olhos distantes, olhos de ressaca, como os de Capitu... Olhos! É o que acho que há de mais belo e perfeito na mulher.<br />
Mas, a maior razão pela qual eu amo os olhos é que, com toda a divina perfeição que somente à mulher a criação atribuiu, há algo que supera, ultrapassa todos os demais caracteres que a formam. É a alma feminina! Este espírito de doçura, delicadeza e inteligência que nós, homens, nunca teremos, é o que acho mais belo na mulher! "Mas isto não é parte da anatomia feminina!" objetará alguém menos perspicaz. Desculpe-me, se eu falava de você, caro leitor, ninguém ficará sabendo se você não o disser. Não faz parte da anatomia, claro, concordo. Mas é lindo como os olhos são capazes de transparecer tudo, e denunciar o que há por trás daqueles seios siliconizados e daquele físico escultural malhado por horas a fio todo dia na academia. São os olhos que revelam quem você realmente é, e a sua beleza a cada dia mais me encanta. "As janelas da alma", segundo a sabedoria popular. É verdade!<br />
E isso, para ser mais sincero ainda, não é só o que acho de mais belo na mulher. Quando o animal dentro de mim não está gritando desesperado por sexo, e eu penso com mais clareza, também é um olhar o que mais me excita, o que mais me incita à imaginação, e não a exposição do objeto que se tornou o corpo da mulher, abundante, em toda a parte, da forma mais vulgar possível.<br />
Respondida a pergunta?<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 10 de janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7617139008838083798.post-66447050145149782552010-01-08T07:00:00.000-08:002021-10-01T11:09:38.522-07:00Inconstância Inconstância.<br />
Talvez, a vida não se devesse chamar "vida", mas inconstância. Todo o universo, na verdade, não apenas a vida. Não é uma mera questão de semântica, vocabulário, ou de mera definição. Vai além da questão vernacular. Nada é estático. Em uma canção do clássico musical "Jeckyll & Hyde", na Broadway, o protagonista - quando sob controle de seu "eu" bonzinho - brada, uma verdade digna da atenção recebida: "The only thing constant is change".<br />
O ilustre cientista britânico, que ilumina os sonhos dos espectadores, na Broadway - e cuja segunda personalidade, antagônica, assombra os palcos desta região ícone do teatro - não está enganado. A única coisa que continua, sempre, é a mudança. Ainda assim, para não se contradizer, a mudança não é tão constante, tendo seu ritmo alterado de forma que nos parece aleatória..<br />
Há mais, sejamos mais concretos: o universo está em movimento de expansão, não vai parar. O Sol, aparentemente "quietinho" no seu lugar, está em constante movimento; além disso, esta mesma estrela que nos ilumina há alguns bilhões de anos e garante nossa existência, ainda vai terminar por devorar a terra, daqui a mais alguns bilhões de anos. As pedras, os diamantes, ingênuos símbolos de resistência e durabilidade, são perfeitamente moldáveis, nem que pelas forças da natureza, e, antes que o Sol ou algum buraco negro os devore, terão sido alterados, ou mesmo desintegrados por algum processo. Aliás, achamos, mesmo, que estas coisas vão demorar muito para acontecer, mas é porque a nossa existência material é tão ínfima, que não percebemos que não passamos de um piscar de olhos, na existência do universo.<br />
E é assim, entre tentativas e investidas, vitórias e derrotas, sucessos e fracassos, namoros, separações, caças e parcerias, que, a cada momento, a vida e o universo se renovam, inconstantes a ponto de nunca deixar de nos surpreender! É aquela pitada de um tempero desconhecido, que dá o sabor único que nunca se repetirá em outra receita. Saboreie-a!<br />
Bon Appétit!<br />
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<div style="text-align: right;"><i>Pablo de Araújo Gomes, 08 de janeiro de 2010</i></div>Pablo Gomeshttp://www.blogger.com/profile/03746112705378014361noreply@blogger.com0